Como surgiu a Sexta-feira 13?


E eis que nos deparamos com a primeira sexta-feira 13 do ano. Para alguns um dia comum, como outro qualquer. Para outros, talvez a grande maioria, uma data recheada de simbolismo e significados, seja como prenúncio de boas coisas ou como indicativos de apuros pelo caminho. Mas o fato é que, popularizada pelo cinema com filmes de terror ou idealizada pelos interessados em assuntos místicos, a coincidência entre o dia 13 e aquele que para nós é o último dia útil da semana tem raízes muito mais antigas do que muitos poderiam pensar.

E uma delas certamente se refere àquele que é tido como o “Pai dos Números”, Pitágoras. O pensador grego que viveu no século VI a.C. acreditava que os números estavam na base de tudo o que havia na natureza, que assim podia ser conhecida em seus princípios essenciais através do estudo das propriedades numéricas. Para ele os números de 1 a 9 estavam mais próximos da divindade, sendo considerados puros e originais. Já aqueles formados por dois algarismos, com exceção do 11 e do 22, deveriam ser decompostos até se chegar a um dos números puros. Assim, o 13 seria pensado como 1 + 3, que daria origem ao 4, que no misticismo pitagórico se destaca pela formação das figuras geométricas regulares e equilibradas, como o quadrado e o retângulo, símbolos da razão e da objetividade. Uma característica portanto positiva num mundo moderno regido pelo conhecimento científico e pela precisão dos números.

Mas o 13 também contou com a história e seus personagens para receber um sentido negativo, e nesse ponto de vista a cultura cristã está repleta de episódios envolvendo o numeral. Um deles estaria relacionado aos conhecidos e misteriosos Cavaleiros Templários, que passaram a sofrer cruéis perseguições na Europa, depois de se recusarem a incluir em seus quadros o rei francês Filipe IV. Ele achava que seu trono estava em perigo pelo grande poder que nele era desfrutado pela igreja Católica e queria se abrigar na ordem. Enfurecido, o monarca teria ordenado no dia 13 de outubro de 1309 a extinção dos membros, o que inaugurou um período de muitas perseguições e intolerância pelo continente.

É também da cultura cristã medieval uma outra possibilidade envolvendo a sexta-feira 13. No período em que povos chamados “bárbaros” invadiram a Europa, algumas tribos de origem nórdica, de crença politeísta, passaram a amaldiçoar algumas de suas antigas divindades à medida que foram se convertendo ao cristianismo. Uma delas, Frigga, deusa do amor e da beleza, passou a ser repudiada e sobre ela foram sendo construídas muitas narrativas que expressavam suas supostas ligações malignas. Segundo uma delas, a antiga divindade e agora uma bruxa costumava se reunir com outras 11 feiticeiras e mais o demônio para amaldiçoar os cristãos. Mulheres, aliás, estariam sempre envolvidas nesses assuntos misteriosos e fantásticos, como se pode constatar, por exemplo, pelo dia de sexta-feira que muitas crenças místicas reputam a divindades femininas, como Vênus, Afrodite e até a Iemanjá do nossos cultos afro-brasileiros. Quase sempre perseguidas a amaldiçoadas pelos seus supostos dons divinatórios e encantadores.

A sexta-feira e o número 13 também aparecem relacionados a passagens bíblicas. Não se pode esquecer que a paixão de Cristo ocorreu numa sexta-feira, e que a Santa Ceia, momento decisivo da trajetória de Jesus, quando ele propõe a aliança com os apóstolos e anuncia o martírio ao qual será submetido, era composta por 13 pessoas, como se pode ver na cena clássica imortalizada por vários pintores do mundo cristão. Num sentido menos histórico e mais esotérico, o 13 convertido em 4, como vimos acima no misticismo pitagórico, além de remeter ao quadrado, também pode ser associado a outra figura geométrica carregada de simbolismo, a cruz, que lembra o sacrifício do Cristo e com isso enfatiza as ideias de redenção e transformação, tidas como caminhos fundamentais e inevitáveis para os seres humanos. Ah, e há também a figura da mãe de Jesus, Maria, que ganha importância no catolicismo e é encarada como a 13ª integrante do colégio apostólico, no lugar do traidor Judas. E foi ainda num dia 13, do mês de maio, que ocorreu uma das mais conhecidas das ditas “aparições” de Nossa Senhora, na cidade portuguesa de Fátima.

Estudiosos da Bíblia afirmam a presença do número 13 em pelo menos 19 oportunidades ao longo das Escrituras, o que faz dele um importante fator numa obra que frequentemente é analisada com apoio nas antigas ciências numerológicas. Principalmente naqueles momentos em que aparentemente não há uma explicação lógica para a opção por aquele número, como ocorre por exemplo quando os textos anunciam a circuncisão de Abraão aos 13 anos de idade, que Josué e seu exército conquistaram Jericó depois de dar 13 voltas em torno da cidade ou que foram gastos 13 anos para construir a morada do rei Salomão.

Para confirmar a teia de mistério envolvendo o número 13 basta lembrar também que ele está presente em uma das mais geniais descobertas da matemática, a famosa Sequência de Fibonacci. Encontrada no início do século XIII pelo italiano Leonardo de Pisa, está relacionada a antigas medidas que já haviam sido estabelecidas pelos gregos e refletiriam a perfeição das formas da natureza. A sequência na verdade trabalha com a ideia de um número como resultado da soma de seus dois últimos antecessores. O interessante da descoberta é que, a partir daí, foi possível entender as inúmeras proporções presentes no mundo natural, fazendo dela uma espécie de “medida divina”, como aliás buscavam os antigos.

E matematicamente não para por aí: o 13 também pode ser entendido como a soma do primeiro número primo (o dois) com o que imediatamente lhe antecede (o onze). Resulta ainda da soma dos quadrados dos dois primeiros números primos (22+ 22= 13). Ufa! Revirado pela matemática, dá pra ver que não se trata de um número qualquer, e não espanta que esteja envolvido em tantas questões misteriosas e servido de pano de fundo pra tantas lendas e histórias. Falta dizer também que o 13 aparece em algumas das medidas estabelecidas para as grandes pirâmides do Egito antigo, e que no Tarô há o Arcano Maior XIII, a “carta da morte”, ao mesmo temida e admirada, porque pode significar tanto o bem quanto o mal, segundo dizem os que se dedicam a essa milenar forma de compreender a vida.

O fato é que em um contexto tão marcado pela lógica própria de um mundo cientificista, superstições, lendas e histórias fantásticas ainda parecem ser necessárias, marcando pontos de ligação com outros tempos e com características culturais que andam mais próximas de nós do que imaginamos. Se por um lado há uma certa da exploração da sexta-feira 13 atendendo a comercialismos e a construções de imagens no mundo publicitário, por outro não falta quem encare com seriedade essa combinação de dia da semana e número de forte apelo simbólico. Para alguns, prenúncio de momentos difíceis, pra outros sinal de um bom dia para se investir no futuro. Seja qual for a maneira com que as pessoas se colocam no mundo tecnológico e científico do século XXI, poucos reagem com indiferença a uma sexta-feira 13. Até mesmo os céticos, que podem viajar no imenso acervo de informações culturais que está por trás desse tema. E nessa, que é a primeira do novo ano que se inicia, que apostas você faria?

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*A ilustração desse artigo é “São Miguel e o dragão”, de Rafael Sanzio.


Por Sandro Gomes | Professor, escritor, mestre em literatura brasileira e revisor da Revista Appai Educar.

 

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