Novas questões sobre a vida de Jesus

a vida de jesus
Jesus, em pintura do francês Hyppolite Flandrin (1809 – 1864)
Com a descoberta entre 1945 e 1947 de vários escritos muito antigos que acabaram recebendo o nome de Manuscritos do Mar Morto, muitas discussões vieram à tona a respeito dos acontecimentos que marcam a história do cristianismo. Isso porque os documentos encontrados, que datam do século I ao III da Era Cristã, trazem surpreendentes informações sobre situações envolvendo a vida de Jesus, que, ou não apareceram nos evangelhos chamados canônicos, ou constam ali relatados de outra forma. Em outras palavras, tratam-se de escritos capazes de suscitar o questionamento sobre o que de fato está retratado nas escrituras.
Contribuíram também para essas questões algumas conclusões a que chegaram pesquisadores que têm se debruçado sobre os estudos históricos e arqueológicos sobre aquela época. Dentre estes a constatação de que os evangelhos admitidos pela tradição cristã como canônicos apresentam certas impropriedades do ponto de vista histórico. Primeiro porque já se sabe com certeza que eles não foram escritos na época apontada pela Igreja, o que é um fator que põe em xeque a validade histórica de um documento. Em segundo lugar, sabe-se que foram alvo de várias intervenções ao longo do tempo, isto é, foram de algum modo editados.
Assim, a descoberta dos manuscritos e a produção científica subsequente serviram para acender antigas discussões teológicas, principalmente a respeito de alguns pontos que aparecem de forma obscura nos textos canônicos. Importante saber que os quatro evangelhos adotados pela Igreja ganharam a supremacia sobre os outros no século IV da Era Cristã, quando o imperador Constantino, interessado numa aliança com os cristãos para fortalecer seu poder em Roma, interviu para organizar a religião, e o primeiro passo seria o de estabelecer quais textos seriam considerados oficiais. Como os quatro evangelhos pareceram expressar o pensamento da igreja naquele momento, foram decretados como canônicos, sendo todos os demais considerados apócrifos. Vejamos algumas possibilidades levantadas pelos documentos encontrados no sítio arqueológico.
Maria de Magdala seria a preferida de Jesus
Alguns dos textos encontrados mencionam um suposto ciúme por parte dos apóstolos pelo fato de Magdala ser muito próxima a Jesus. Ela é apresentada como uma mulher dotada de muita sabedoria e grande capacidade de liderança, o que lhe rendia muito respeito por parte do Mestre, que lhe confiava várias tarefas de importância. Um dos escritos, atribuído a um certo Filipe, datado do século II, chega a afirmar que Jesus costumava beijá-la na boca. Uma imagem bem diferente da que se firmou na tradição cristã, que a retrata como uma prostituta, apesar de a própria Igreja Católica já haver revisado suas interpretações dos textos bíblicos a esse respeito e retirado de Maria de Magdala essa denominação negativa.
A existência de um quinto Evangelho
Entre os documentos achados, um chama atenção por ser atribuído a Tomé, um dos doze discípulos de Jesus. Contendo mais de cem parábolas que teriam sido expostas pelo Cristo, tem conteúdo semelhante ao presente nas escrituras canônicas, mas com certas diferenças que o aproximam mais da visão dos gnósticos, uma das mais antigas seitas relacionadas ao cristianismo. Mesmo tendo sido provavelmente escrito quase na mesma época que os textos oficiais, acabou ficando de fora do cânone definido no século IV. Denominado pelos estudiosos como o “Quinto Evangelho”, suspeita-se que seja ele a famosa Fonte Q, um escrito que estaria na base de três dos quatro evangelhos oficiais. Se isso for comprovado, o evangelho de Tomé seria considerado a verdadeira fonte dos ensinamentos cristãos.
A infância de Jesus
Uma das descobertas mais polêmicas dos manuscritos talvez seja essa, que revela algumas coisas sobre um dos períodos mais obscuro nos relatos dos evangelhos oficiais: como foi a infância de Cristo (a única menção na tradição cristã é a do episódio em que Jesus permanece no templo aos 12 anos). Ali um evangelho do século III narra histórias no mínimo curiosas, como a de que Jesus se distraía criando bonecos de barro aos quais dava vida. E uma passagem na qual, depois de um conflito com outro garoto, Jesus teria ordenado que ele morresse, o que de imediato aconteceu. Em seguida, porém, teria se arrependido e intimado o colega a ressuscitar. Para alguns teólogos, tais narrativas expressariam a tentativa desses primeiros cristãos de demonstrar a natureza ao mesmo tempo divina e humana do Cristo. Uma discussão que mobilizava os religiosos da época.
Judas não teria traído Jesus
Essa possibilidade foi motivada por um outro achado arqueológico, bem mais recente que os do Mar Morto. Trata-se de textos encontrados na década de 1970 no Egito, escrito em língua copta. Neles aparece uma visão bem diferente do traidor que a cristandade acostumou-se a ver em Judas Iscariotes. Ele seria na verdade um dos apóstolos mais próximos de Jesus e assim foi escolhido para a tarefa de entregar seu mestre às autoridades romanas, o que seria fundamental para o projeto de salvar a humanidade. Judas assim se livra da péssima reputação que a tradição cristã lhe reservou e, ao contrário, escapa também do suicídio. Diz o texto que, depois de cumprir as determinações de Jesus, o discípulo teria buscado o deserto para meditar e orar. 
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A coluna deseja a todos um Feliz Natal e um 2017 cheio de alegrias.

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