A renovação das escolas e da pedagogia

 
Existem determinados lugares no mundo em que essa transição está em curso, e por isso essa reflexão é tão necessária. Não é fácil, certamente não é, porém vai levar menos tempo do que imaginamos para ocorrer. Um novo tipo de educação escolar vai ser implementada e concretizada (Nóvoa acredita em algo em torno de 20 a 25 anos para que seja concretizada). Ele diz que isso acontecerá, certamente, por uma simples razão: porque as mudanças não vão vir de cima, de uma lei, de uma reforma, de uma teoria pedagógica, mas de nossos alunos, isto é, vão ser exigidas pelos nossos estudantes, será reivindicada por eles, essa nova geração que vai obrigar professores e escolas a mudar suas formas de trabalhar. Sim, será uma revolução que não tem paralelo com nada que conhecemos em 200 anos de história. Nóvoa citou o filósofo francês Michel Serres, que aponta que essa revolução é grandiosa e que só temos uma parecida com ela, aquela que ocorreu há 500 anos, a revolução que aconteceu com a invenção do livro… “Se não compreendermos a necessidade dessa mudança, a escola, e sobretudo a escola pública, vai ficar cada vez mais desgastada, cada vez menos prestigiada, cada vez menos capaz de atender aos desafios do século XXI”, afirma o mestre em educação.
 
Essa mudança já é notada nas elites. Nos EUA já há três milhões de crianças que não vão à escola, porque os seus pais entendem que as instituições não dão conta da educação e que há outras maneiras de poder educar as crianças sem ter que ir à escola.
 
Aqui no Brasil, em maio de 2016, Nóvoa acompanhou um relatório apresentado em uma Conferência no Rio de Janeiro, que informou que a educação domiciliar já aumentou no Brasil, nos últimos cinco anos, 985%. O que quer dizer que muitas pessoas começam a achar que a escola não dá conta e que há outras maneiras de propiciar educação às crianças, através das tecnologias e processos diversos e que a escola atual pode se tornar uma instituição dispensável.
 
“Nós precisamos de um profundo movimento para a renovação das escolas e da pedagogia. Isso já vem ocorrendo em muitas das nossas instituições, já existem milhares de professores em todo o mundo. Por isso, nós temos que ser capazes, também, mesmo com todas as dificuldades salariais, falta de infraestrutura nas escolas e tantos outros percalços, de ir caminhando no sentido dessa mudança”, ressalta Nóvoa.
 
E a pergunta feita pelo educador foi: os professores têm futuro? E a resposta: sim! Eles continuarão a ser uma profissão extraordinariamente importante, mas terão que perceber as transformações radicais que acontecerão no trabalho docente.
 
Para traduzir tais mudanças, de maneira muito simples, Nóvoa recorreu à imagem do tablet, para explicar quatro pontos importantes dessa questão:
 
1) A relação com o conhecimento – que é o estruturante dentro de uma escola – muda depois da presença do digital, e o tablet reflete isso. Porque interfere na relação do professor com o conhecimento.
 
2) Também muda a pedagogia, que deixa de ser vertical e passa a dar lugar a um processo horizontal, interativo, muito mais da relação do que da transmissão de um determinado tipo de conhecimento.
 
3) Quando falamos de mobilidade, percebemos que as formas de aprender estão mudando e muito nas escolas.
 
4) E, por fim, percebemos que hoje a educação se faz dentro e fora do espaço da escola; entendemos as mudanças muito significativas que estão acontecendo no interior do espaço escolar.
 
Dessa forma, o trabalho docente muda radicalmente, e o professor precisará atuar de outra maneira, mantendo outro tipo de relação com o seu trabalho, dentro da escola.
 
Nóvoa ressalta ainda, sobre os quatro pontos apresentados sobre a metáfora do tablet, que:
 
1) Conhecimento – Está constatado que durante muitas décadas o acesso ao conhecimento foi feito por meio do professor. Ele transmitia. A partir de agora não será mais assim, pois os alunos terão como chegar direto nas informações, por meio do digital. Por vezes, os estudantes já têm mais acesso a isso do que os próprios professores.  
 
Portanto, agora o papel do docente não será mais transmitir conhecimentos, e sim atuar como um organizador da informação, que ajudará os alunos a construir a sua própria compreensão, para darem sentido a esse conhecimento. Caberá ao professor conduzi-los à pesquisa, dar orientação clara, promover trabalhos em grupo. Desta forma, ele vai organizando, dando sentido às atividades, o que é muito diferente de estar numa sala de aula, com um quadro-negro “dando” informação, sem parar. Sua tarefa agora é disponibilizar as formas de acesso ao conhecimento e não mais ministrar conteúdo.

 

 

2) Na pedagogia essa mudança se dá de uma pedagogia frontal (de um professor para um grupo de alunos “normalizados”, ensinados simultaneamente, tratando todos da mesma maneira) para uma pedagogia que valoriza as relações, não só entre professores e alunos, mas todas as ligações que existem no espaço da sala de aula: entre alunos, alunos e professores, entre diversos tipos de alunos, entre diversos grupos, uma pedagogia cooperativa. Nóvoa salienta que os estudantes aprendem mais uns com os outros do que com professores (experiência da escola de Medicina de Harvard), sendo essa a base da pedagogia da cooperação.
 
3) Na aprendizagem a mudança ocorre não mais por meio do ensino imóvel, aquele fechado no espaço da sala de aula, mas vai se realizar numa diversidade de lugares e processos de aprendizagem individualizados e em grupo. Assim, a paisagem, o retrato da sala de aula não será mais o de 30 ou 45 alunos sentados, mas quatro a cinco alunos num lado atuando em grupo, do outro lado outros cinco trabalhando individualmente, outros em outros espaços, de maneira que a escola se torna um local de enorme diversidade de lugares e processos de aprendizagem. O dia a dia do estudante não vai ser feito de “aulas dadas” e sim de um conjunto de atividades (em grupo, pesquisa, individual), muito mais do que de lições estruturadas como vemos ainda hoje.
 
4) E, sobre a mudança do espaço educativo, ele afirma que a escola vai evoluir do modelo de prédio escolar, fechado, para um conjunto de lógicas de educação no espaço social (em alguns casos presenciais e, em outros, virtuais).
 

 

O palestrante cita que um estudioso que na opinião dele melhor intuiu isso foi Ivan Illich, que escreveu o livro “Sociedade sem escolas”, em que dizia que nós tínhamos trazido as crianças para dentro da escola, mas que agora esta iria se desmaterializar e criar situações de maior capilaridade educativa com a sociedade. De certo modo dizia que a educação iria continuar acontecendo nas escolas, mas não só nelas. Que essa permeabilidade com os espaços sociais seria grande, fluida e informal e geraria boas formas de aprendizagem.
 
 

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