Robôs na sala de aula?


Muito se fala, nos dias de hoje, em Inteligência Artificial e suas promessas de um mundo totalmente diferente desse a que estamos acostumados. Uma das figuras que com mais frequência nos vem à mente com relação a esse assunto são os robôs, que na visão de grande parte dos teóricos da tecnologia vão ser “criaturas” muito presentes na vida de todos nós num futuro não muito distante.

Em muitas ocasiões atualmente já nos deparamos com ligações ou atendimentos em que nossos interlocutores são robôs, mas também presenciamos situações em que simplesmente não conseguimos nos entender com a máquina. Seja porque ela não nos compreende ou devido a seus poucos recursos ao se comunicar conosco. Porém, o que é prometido com o desenvolvimento da inteligência artificial é muito mais do que isso.

Na verdade, a expectativa de quem atualmente trabalha desenvolvendo robôs para se comunicar e resolver problemas para seres humanos é a de que eles sejam capazes de atuar de forma tão eficaz – e talvez até melhor – quanto fariam pessoas de carne e osso. As máquinas estão sendo preparadas para uma interação muito grande conosco, a ponto de poderem deter um grande repertório de situações que garantam a comunicabilidade e a satisfação de quem busca um serviço de atendimento, por exemplo.

Mas, para que se chegue a esse sonhado ponto, os desenvolvedores de algoritmos estão recebendo uma ajuda preciosa de gente que aparentemente nada tem a ver com a ciência da computação. Estamos falando dos linguistas, profissionais da área de Letras, que estão sendo fundamentais na tarefa de dotar os robôs de condições de comunicação com seres humanos. Isso mesmo, os profissionais de linguística são hoje muito importantes no trabalho de “ensinar robôs” ou, como já é chamado nos meios tecnológicos, chatbots teachers.

Afinal, os idiomas envolvem muito mais do simplesmente exibir um conjunto de palavras, frases, períodos e textos. Eles refletem as complexidades dos seres humanos, o que significa dizer que ensinar línguas a robôs corresponde a dar a eles condições de compreender algumas coisas da alma humana e suas muitas variantes. Vamos a um exemplo que permitirá entender como está sendo a tarefa dos linguistas.

Imagine que você entre num restaurante e faça a seguinte pergunta ao garçom: “Você tem guaraná no seu estabelecimento?”. Se estivéssemos em Portugal, muito provavelmente a resposta que você receberia seria “sim” ou “não”. Afinal, você fez uma pergunta que demandaria uma resposta com essa. Como estamos nos referindo a uma situação em que estamos nos comunicando em português “brasileiro”, muito provavelmente a resposta do garçom seria algo como: “Normal, zero ou diet?”. Ou seja, a nossa forma de comunicar faz com que uma pergunta feita de um modo que demandaria um determinado padrão de resposta seja automaticamente interpretada de uma maneira diferente, voltada para resolver a questão envolvida naquele diálogo.

São fenômenos como esses que os linguistas precisam ensinar aos robôs para que eles possam agir num atendimento de forma a satisfazer quem buscou a sua ajuda. As questões envolvendo a comunicabilidade humana e suas variantes, como práticas dialetais, vícios de linguagem, interjeições, sotaques, fraseologia, entre outras, estão no campo de conhecimento do linguista, de forma que é dele que parte todo o conhecimento que os desenvolvedores de tecnologia precisam deter para dotar a máquina de todos os recursos suficientes para o desempenho da tarefa pretendida.

Com o avanço cada vez maior da inteligência artificial, a meta das instituições que estão trabalhando em projetos de robótica como esses é de que os chatbots (em português, algo como “robôs que conversam”) atinjam a condição de se comunicar de maneira perfeita com seres humanos, a ponto de poderem assumir sozinhos a tarefa. É claro que não estamos ainda perto disso, mas a parceria entre linguistas e desenvolvedores de tecnologias segue a plenos pulmões, com muitas instituições já conseguindo importantes progressos.

A ideia de que as máquinas poderiam um dia vir a dominar o mundo, depois de atingir uma capacidade de avaliar e tomar decisões mais racionais e perfeitas que a dos seres humanos, pode até ser algo do nosso imaginário, alimentado pelas produções cinematográficas. Pode ou não virar realidade. Mas, no que depender desse encontro entre profissionais de exatas e de humanas, os robôs poderão pelo menos aprender a se comunicar de forma proveitosa com os seres humanos, resolvendo problemas, satisfazendo necessidades e, quem sabe, liberando as pessoas para se dedicarem melhor às questões mais caras à humanidade.

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Por Sandro Gomes | Professor, escritor, mestre em literatura brasileira e revisor da Revista Appai Educar.


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