Coronavírus…vamos sair dessa!


Provavelmente nenhuma outra palavra foi tão utilizada no planeta como coronavírus. O que é compreensível em função do cenário desenhado para todo o planeta, daí ter sido declarado pela ONU como uma pandemia.

É claro que a insegurança e o desconhecimento da real potência desse vírus levam as pessoas a uma situação de temor e, em alguns casos, pânico. Mas a boa notícia é que nós já passamos por várias situações como essa e…sobrevivemos!

Doenças arrasadoras levando populações ao terror são registradas desde a Antiguidade, como é possível deduzir, por exemplo, em gravuras em papiros do Egito Antigo e em textos de autores gregos e romanos. Nesse contexto elas são quase sempre atribuídas aos deuses e a supostos castigos aos homens.

Mas talvez a epidemia mais lembrada no passado tenha sido a Peste Negra, que fez milhares de vítimas entre a Europa e a Ásia no século XIV. Apesar dos resultados tenebrosos, a doença não era outra senão aquela hoje conhecida como peste bubônica, transmitida por ratos urbanos, atraídos pelas más condições de higiene, características da Idade Média e o pouco espaço que ali estava reservado para o desenvolvimento da ciência.

Foi uma peste que ajudou a colocar pra fora todos os “demônios” daquele período. Afinal as pessoas mantinham crenças um tanto esdrúxulas, como a de que as doenças eram trazidas por forasteiros ou que resultavam de feitiços e magias, praticados por bruxas, ciganos, judeus e demais grupos que acabavam, justamente por isso, condenados às fogueiras.

O medo da doença foi algo tão presente no homem medieval que as pessoas não tinham outra saída a não ser recorrer à fé. Isso gerou o surgimento de duas devoções católicas que se tornariam muito populares: São Sebastião, o militar romano que resistiu bravamente à morte e passou a ser evocado nas pestes, e Santa Corona – acredite, o nome do vírus de hoje não tem nada a ver com ela –, que foi martirizada no século II e declarada pela Igreja como a padroeira contra as epidemias.

Os europeus aliás exportaram suas epidemias para o Novo Mundo. A varíola, outra doença com registro no mundo antigo, esteve entre as principais causas de mortalidade nas colônias americanas, atingindo principalmente os indígenas, muito vulneráveis diante de uma doença para a qual não possuíam anticorpos. Mesmo o devotamento dos jesuítas, a principal força de saúde daqueles tempos, conseguiu evitar as perdas.

A “bexiga”, como ficaria conhecida por aqui, acabaria entrando para a história por ter sido a primeira moléstia a ter como tratamento uma vacina, desenvolvida no século XVIII pelo britânico Edward Jenner após pesquisas feitas com vacas (a palavra “vacina”, aliás, vem de “vaca”). Há quem diga que séculos antes chineses já tentavam extrair as secreções que minam das feridas causadas pela varíola e utilizar para tratar os doentes, inclusive com certo sucesso.

No século XIX foi a vez do cólera deixar suas marcas. A novidade desse surto foi que, na esteira de um mundo interligado por invenções como a locomotiva e a navegação a vapor, se tornou a primeira pandemia da história, já que só a Antártica escapou de seus efeitos. Ficou tão marcante que até serviu de pano de fundo para um dos grandes clássicos da literatura universal, “O amor nos tempos do cólera”, do colombiano Gabriel García Marquez.

Apesar de bem posterior ao período medieval, a doença também tinha como fonte condições insalubres de vida, como água e alimentos contaminados. O que não espanta que tenha feito tantos estragos na América no Novecentos, de povoamento desordenado e com condições de saneamento básico muito desproporcionais.

Já no século XX foi a vez da Espanhola, uma mutação do vírus que habitualmente causa gripe, e que acabou se espalhando de forma avassaladora. Até hoje brasileiros que viveram ou se lembram daquela época relatam o medo da população, justificado em função da alta taxa de letalidade. Uma epidemia que, a exemplo da atual, não considerou diferenças de nenhum tipo, sejam de gênero ou classe social, haja vista de ter tirado a vida até do presidente brasileiro Rodrigues Alves, que assumiria o mandato pela segunda vez.

Ainda podemos citar outras doenças que, se não chegaram a ser pandemias, atingiram um número muito grande de pessoas e de maneira impiedosa, como a aids e a tuberculose. A boa notícia é que a humanidade conseguiu resistir a todas elas. Houve perdas, é verdade, mas no fim os esforços coletivos conseguiram evitar extermínios maiores.

Enfim, como tudo, mesmo as tragédias, têm um lado bom, várias conquistas positivas ficaram para o acervo da humanidade, como as vacinas, o avanço científico e até grandes obras da literatura universal, como vimos. E não podemos esquecer que hoje contamos com armas de que nossos antepassados não dispunham: as maiores possibilidades na ciência e na tecnologia de todos os tempos!

O que ficará de positivo quando a palavra “coronavírus” desaparecer de nosso vocabulário? Mais solidariedade? Mais conhecimento? Mais união entre as pessoas? Reconciliação com desafetos? Seja o que for, vamos sair no lucro, pois nós sobreviveremos e de quebra teremos a chance de tornar o mundo um lugar melhor.


Por Sandro Gomes | Professor, escritor, mestre em literatura brasileira e revisor da Revista Appai Educar.


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