Ciências em ação

Popularizando a Ciência para os muros da escola


Pesquisadores e profissionais de variados ramos de conhecimento participaram da Semana da Ciência e Tecnologia no Colégio Estadual Professora Antonieta Palmeira (Cepap), no Colubandê, município de São Gonçalo. Durante três dias, acadêmicos e profissionais de variadas áreas do mercado desenvolveram oficinas criativas de popularização do conhecimento. A proposta integra o PEPCiências (Educação Popular em Ciências), ação de extensão universitária concebida a partir de diálogos colaborativos entre o Cepap e o Grupo Interdisciplinar de Educação, Eletroquímica, Saúde, Ambiente e Arte (Gieesaa) em parceria com o Instituto de Química (IQ) da UFRJ.

Os coordenadores do projeto são os professores Célia Souza, da UFRJ, e Francisco Coelho, do Cepap, que também fazem parte do Gieesaa. O PEPCiências objetiva tornar a ciência mais simples, mais tangível para os alunos e para a comunidade. “Ele não é só uma atividade escolar. É uma proposta que preza a pedago-gia social, que ultrapassa os muros da escola convidan-do ex-alunos, pais, a comunidade como um todo para que venham falar de ciências neste grande congresso”, afi rmou Coelho.

De acordo com um dos coordenadores do projeto, há necessidade de se buscar mecanismos de popularização que incluam as pessoas em diferentes assuntos e pesquisas na educação básica

 

Durante três dias a comu-nidade escolar e entorno partici-param ativamente das 33 oficinas oferecidas no horário noturno do Cepap. Todos os profissionais envolvidos são voluntários e, segundo Coelho, eles também acreditam na importância da popularização das descobertas científicas, a partir de uma lingua-gem que seja capaz de aproximar conhecimentos produzidos pelos cientistas daqueles que, em últi-ma análise, também participaram do financiamento das mesmas.

“É um desafio tirar a pro-dução científica da clausura dos laboratórios e periódicos”, afirmou Francisco Coelho, ao enfatizar a necessidade de se buscar me-canismos de popularização que incluam as pessoas em diferentes assuntos e pesquisas na educa-ção básica. Para ele, mais do que falar de cada uma das oficinas – todas relevantes – torna-se vital enfatizar a participação de ex-alu-nos do Cepap que se tornaram acadêmicos e profissionais que continuam voltando à escola para participar de uma ação solidária. Nesta segunda edição do PEP-Ciências, cinco deles interagiram com suas oficinas no colégio.

Foi o caso de Douglas Diniz, que ingressou no curso de Biologia e é parceiro da escola desde 2004. Ele abordou o tema “Biologia das serpentes” e levou como convidada a veterinária Amanda Hardoim para promo-ver uma oficina de zoonoses, doenças causadas por animais domésticos. Conforme Coelho, o futuro professor de Ciências concluiu a sua formação básica na escola e é um dos catalisadores de uma série de outros parceiros.

Outro exemplo de retorno às bases foi dado por Larissa Sil-va e Paulo Hassan. Os dois foram alunos de Francisco Coelho tanto no Cepap como na Uerj-FFP (Fa-culdade de Formação de Profes-sores) no curso de Biologia. Ela desenvolveu a oficina de “medi-cina das plantas” e ele a de “es-tudos dos jacarés”. “Larissa se propôs à meta voluntária de fazer a escola onde estudou crescer e, tanto ela como o marido, se tornaram parceiros do projeto”, frisou Coelho, feliz com os frutos que brotam.

Outro ex-aluno que chamou a atenção da comunidade escolar com um tema pra lá de inte-ressante foi Hans Muler, que falou sobre plásticos comestíveis. Graduado em Geografia e próximo de ver seu sonho se tornar realidade – dar aulas na escola em que estudara e fizera estágio – Muler se dedica a pesquisar esta invenção tecnológica que interfere no nosso cotidiano. “Apesar de não ser algo que vamos sair mastigando como uma bala, é uma boa saída para pessoas e empresas que buscam um material não tóxico e com alto índice de degradação. O material do plástico comestível é fabricado a partir de amido de milho, enquanto os convencionais são derivados do petróleo. Biodegra-dável, o bioplástico desaparece do planeta em poucos meses, enquanto o tradicional leva mais de um século.

Uma das oficinas chamou a atenção por ter entre participantes mães de alunos: “Ciência e Arte Indígena”, com Allan dos Santos. O pesquisador levou vários exemplos de arte produzida por vários povos indígenas, estampada em cerâmica e artefatos pessoais. Segundo ele, este tipo de arte vai além da dimensão material, inserindo-se num universo maior, que inclui as relações sociais, a interação com a natureza. Durante a oficina, os presentes foram convidados a realizar uma pintura coletiva em tecido com o grafismo inspirado na cultura dos primeiros habitantes do país.

Outro tema em debate, entre os muitos, foi o trânsito. Augusto Vieira, instrutor de uma autoescola e com vasta experiência como socorrista, abordou a questão da má combinação entre direção e ingestão de álcool. Ele integrou equipes da Lei Seca – criada pela Lei nº 11.705, de 19 de junho de 2008, com vistas à redução de acidentes de trânsito causados por condutores alcoolizados. Sem ser alarmista, mas apresentando dados e vídeos, o instrutor falou da importância da implantação da fiscalização e do trabalho de conscientização que vem apresentando, ao longo dos anos, expressiva redução dos índices de acidentes graves e mortes, apesar de os números ainda con-tinuarem altos. “É preciso haver responsabilidade para que o trân-sito seja mais seguro e confiável”, alertou, ao mencionar pesquisas que mostram o impacto dos 10 anos de vigência da Lei Seca: a redução em 2,4% do número de mortes por acidente de trânsito no país. Dados do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, em 2018, registraram 38.273 óbitos por essa causa; em 2016, foram 37.345.

Alunos e ex-alunos da instituição educacional se reuniram para abrilhantar o projeto que teve a participação da família

 

Coelho comentou que muitos dos temas das oficinas surgiram, também, das deman-das levantadas em sala de aula. Como ocorreu com a “Ciência por trás da maconha” desenvol-vido por Maria de Lourdes da Sil-va. A professora da Uerj abordou a trajetória das drogas, como o seu uso não é algo recente e, sim, histórico. Seu objetivo, al-cançado, era o de sensibilizar os jovens para que falassem sobre o assunto. Que entendessem que algumas formas repressoras e proibicionistas podem ampliar os mitos e estigmas acerca das drogas e seus usuários.

Projeto social – Nesta se-gunda edição do PEPCiências no Cepap, os oficineiros convidados ficam livres para compor os obje-tivos de suas atividades. A cada ano, segundo Francisco, o projeto vai sendo readaptado, melhorado, expandido. Os temas são defini-dos nos primeiros contatos tendo como foco a popularização da ciência, do assunto a ser aborda-do. Os objetivos são construídos pelo facilitador e o próprio nome da oficina dá uma impressão da proposta a ser oferecida.

Na primeira edição, a coordenação solicitava os obje-tivos previamente, mas durante a execução, muitas vezes, mu-davam a proposta e os arranjos tinham que ser feitos pratica-mente na hora. Por isso, passou–se a considerar que os focos desse projeto social são a popu-larização da ciência e o abraço à escola com a finalidade de torná-la viva. Não é tão relevante quem realizou a ação ou se os objetivos foram aqueles inicial-mente determinados. O mais im-portante é de onde vem a moti-vação: uma ação solidária de dar retorno à comunidade escolar dos conhecimentos construídos no espaço acadêmico, de forma participativa e dinâmica.

Um dos debates foi em relação à Lei Seca, vigente no país há 10 anos, que promoveu uma redução em 2,4% do número de mortes por acidente de trânsito até então

 

Esse dinamismo se dá ao longo do processo de constru-ção da maratona de atividades em que toda a comunidade escolar é envolvida. O projeto fora concebido a partir de diálogos co-laborativos entre Gieesaa e diferentes instituições de ensino e pesquisa, dentro e fora do Estado do Rio. Para a popularização de assuntos e pesquisas científicas a ideia foi criar mecanismos que incluam diversos atores sociais, protagonistas da elaboração intelectual dos temas estudados, a serem trabalha-dos de forma dialógica em espaços fora da univer-sidade, ou seja, extensão universitária. Conforme os coordenadores, o PEPCiências é um projeto maior que envolve curso preparatório na escola, a semana de ciência e tecnologia, os cursos livres. E, em ela-boração, a semana da saúde mental.

Para a semana de C&T, foi construída uma metodologia que, além de oferecer espaços de diálogo e aprendizagem sobre os diferentes temas científicos, aproximando a ciência da vida cotidiana dos jovens e adultos, definiu que cada oficina teria em média de 15 a 20 alunos, de forma a manter uma relação de proximidade e conforto na turma. Criou-se também uma comissão científica com uma equipe de monitores – alunos que se interes-saram em participar de todo o processo.

O PEPCiências é um projeto que envolve curso preparatório na escola, semana de ciência e tecnologia e cursos livres. Além disso, está em elaboração para o futuro uma semana da saúde mental

 

Cada monitor ficava responsável por um ofi-cineiro convidado e várias tarefas, como a organi-zação do espaço, entre outras. Junto à coordena-ção, criou-se a figura do gerente de imagens, que registrava todas as ações. Como se tratava de um projeto acadêmico, a avaliação se fez a partir de questionários preenchidos tanto pelos monitores como pelos oficineiros. Em um deles, o instrutor de trânsito Augusto Vieira, ao ser questionado sobre como via a relação entre o voluntariado e a popula-rização da ciência nas escolas, sintetizou a essên-cia do projeto social: “Cada um de nós pode doar um pouco do que recebeu em prol do crescimento acadêmico e pessoal dos alunos”.


Por Sandra Martins
Colégio Estadual Professora Antonieta Palmeira – Cepap
Avenida José Mendonça de Campos, 1.776 – Co-lubandê – São Gonçalo/RJ
Tel.: (21) 2701-5577
E-mail: ensinodeciencias.ead@gmail.com
Coordenadores: Professores Célia Souza (UFRJ/Gieesaa) e Francisco Coelho (Cepap/Gieesaa)
Fotos: Marcelo Ávila


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