Quando “o cortiço” vira casa-grande

Uma nova leitura renasce entre os alunos do IFRJ


Exímio caricaturista, o romancista Aluísio Azevedo através de seu clássico “O Cortiço” foi a principal fonte de inspiração para os alunos do Curso Técnico de Informática para Internet integrado ao Ensino Médio, do IFRJ, no projeto Literação. O objetivo foi estimular a interação dos alunos com um dos maiores clássicos de nossa literatura, de forma dinâmica, viva e democrática.

Para entrar no universo naturalista do autor, o professor de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira Adriano Oliveira Santos foi se aprofundando de um modo que nem ele pôde imaginar a proporção e o sucesso que a adaptação da obra de Azevedo tomaria.

A partir das muitas conversas nascidas da leitura e discussão nas classes, durante as aulas de Literatura Brasileira, Adriano percebeu que algo maior poderia ser realizado em cima de todo aquele conteúdo. Foi então que resolveu, juntamente com a turma do 4º período do curso, ir além. “E o que inicialmente seria apenas uma tarefa para cumprir parte da avaliação à qual os alunos seriam submetidos transformou-se em uma grande apresentação teatral”, afirma o professor.

Antes que o produto final fosse apresentado, Adriano e seus alunos tinham em mãos um outro grande desafio. “Além da construção de um roteiro, os estudantes tiveram que estudar minuciosamente os perfis das personagens e cada figurino. Isso sem falar na distribuição dos papéis de acordo com a afinidade deles próprios com o texto e os personagens, para que a interpretação, com isso, se tornasse mais verossímil”, explica o professor bastante orgulhoso do empenho e dedicação de seus alunos.

O estudante Pedro Paulo França da Silva relatou que seu tipo “Miranda” foi bastante desafiador: “Ele é um personagem completamente opressor e que não liga e não ama ninguém. Tive dificuldades para interpretar e, por essa razão, precisei estudar alguns ‘trejeitos’, para colocar no personagem, além de fazer exercícios vocais, pois o Miranda tinha que ter uma voz mais grossa, mais firme, como se espera de um barão. Para mim significou muito viver esse personagem, pois, por ele, eu pude pensar como uma pessoa autoritária, insensível, e eu nunca tinha interpretado alguém assim”.

“A grande lição esteve centrada na interação e cooperação já que, mesmo em um país em que se coloca em xeque o gosto pela leitura, os alunos mostraram sua capacidade e habilidade enquanto leitores críticos”

De acordo com a comunidade escolar, a construção do cenário foi um dos elementos mais importantes no desenvolvimento do projeto. “Ter a responsabilidade de fazer algo que causasse uma imersão no público e que ao mesmo tempo fosse barato e bem apresentado não foi fácil”, conta Gabriel Mendanha.

Entre os momentos da apresentação teatral, um provocou reflexões e emoções na plateia composta por alunos, servidores, diretores, responsáveis e convidados: a separação do casal Jerônimo e Piedade, por conta do alcoolismo vivido pelo personagem. Arthur Silveira Souza, que fez o papel de Jerônimo, traduziu em seu depoimento um pouco do que sentiu:

“Ao interpretá-lo, tentei passar isto: um homem abusivo com sua esposa (a Piedade) e que resolve deixá-la e às filhas sozinhas, sem qualquer amparo. O Brasil está cheio de ‘Jerônimos’; infelizmente, há maridos irresponsáveis ou pais ausentes que não pagam pensão”.

Um outro momento foi marcado pelas transformações no corpo, vivenciadas, na obra, pela personagem Pombinha, e que exigiu da aluna Bruna Siqueira Queiroz bastante esforço de interpretação: “Foi um desafio para mim; tive que repassar a cena várias vezes”, afirma.

 

Muito trabalho em pouco tempo

Segundo o professor Adriano, desde a leitura da obra até a sua encenação, foram necessários três meses de intenso trabalho, para que na culminância, realizada no auditório do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ), campus Eng. Paulo de Frontin, viesse a público o resultado de todo o esforço.

Motivados com o desenrolar do trabalho e a projeção que todas as atividades tomaram dentro e fora dos muros escolares, alunos e professores resolveram expandir o público espectador. “Queríamos compartilhar aquele trabalho com o maior número de pessoas possível, então resolvemos convidar estudantes de escolas vizinhas e até de outros municípios para o evento”, conta Bruna Siqueira Queiroz, lembrando que entre os convidados estão jovens assistidos pelo pelo CRAS da cidade de Vassouras.

Na sequência as alunas Isadora, Giulia e Isis dão vida às lavadeiras do cortiço

Além da divulgação interna, as mídias sociais também tiveram uma forte contribuição na disseminação do projeto entre a comunidade escolar, familiares e amigos do colégio. Uma das responsáveis pela divulgação da peça, a aluna Laísa Maressa Ferreira, não só confeccionou o cartaz, como mostrou um grande talento criativo.

Por fim, o projeto despertou e motivou o envolvimento de outros professores, como Isabella Trindade Menezes, da disciplina de História, que resolveu utilizar o trabalho de forma integrada, com o professor Adriano, também como tarefa de avaliação de sua disciplina. O mesmo ocorreu com a docente de Sociologia Gabriela Kronemberger que, inspirada no caráter interdisciplinar da obra, organizou, em conjunto com as disciplinas de Português e Literatura Brasileira, uma exposição de textos e fotos produzidos pelos alunos do mesmo projeto, que recebeu o título de Desigualdades sociais: os nossos cortiços, relembra Adriano.

Para alunos e professores a grande lição esteve centrada na interação e cooperação, tanto por parte dos educandos – que, mesmo em um país em que se coloca em xeque o gosto pela leitura, mostraram sua capacidade e habilidade enquanto leitores críticos –, como de todos os professores e familiares que perceberam que um time integrado é sinônimo de sucesso.


Por Antônia Lúcia
Instituto Federal do Rio de Janeiro – IFRJ, campus Engenheiro Paulo de Frontin
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CEP: 26660-000
Tels.: (24) 2468-1861 / 2468-1862
E-mail: adriano.santos@ifrj.edu.br
Professor: Adriano Oliveira Santos
Fotos cedidas pela escola


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