Raízes ancestrais na educação integral

Projeto difunde propriedades e conhecimentos milenares das folhas oriundos dos povos originários


Atualmente uma das palavras mais ouvidas nas redes e grandes mídias é ancestralidade. Que por definição apresenta-se como tudo aquilo que é passado pelas nossas gerações anteriores. E com o objetivo de difundir e perpetuar esses conhecimentos oriundos das ascendências dos povos originários – primeiros habitantes de um território –, a professora Bárbara idealizou um projeto de educação ambiental entre as turmas do Fundamental I da Escola Municipal Professora Maria Felisberta Baptista da Trindade, localizada no bairro da Engenhoca, em Niterói.

Usando as folhas e suas propriedades como eixo temático, Bárbara Cristina Felismino dos Santos sensibilizou não apenas os estudantes à adesão ao projeto, bem como professores de outras disciplinas que desenvolveram atividades de maneira interdisciplinar, contendo elementos das linguagens, ciências da natureza e humanas. “Dentro desse contexto também foram elaboradas atividades como produção textual e interpretação de texto, bem como ações ligadas a campos de conhecimento como Biologia, Filosofia, História e Geografia”, explicou Bárbara.

Segundo ela, o objetivo do projeto foi o de atrair a atenção das crianças para esse elemento da natureza, tão presente em nossos dias, destaca a professora considerando todo o conhecimento já produzido na área e principalmente a valorização dos saberes ancestrais a respeito dos usos das folhas.

 

Elementos milenares da natureza

Dentro da proposta decolonial de educação, foram desenvolvidos atividades e subtemas, como, por exemplo: “folha é ser vivo”, no qual as crianças foram convidadas a plantar e a acompanhar o processo de nascimento e crescimento das plantas no espaço escolar.

Já na temática do uso das folhas como remédio, as crianças tiveram acesso a diversas plantas com propriedades terapêuticas, a partir das quais foram produzidos e experimentados vários chás. “Os estudantes observaram a importância dos vegetais no uso de medicamentos, como herança cultural e medicinal dos povos indígenas e africanos, e a valorização destes saberes pelo SUS, por meio das atividades de medicina fitoterápica, que foram incluídas em algumas unidades, incorporando esses saberes tradicionais no cuidado com a saúde”, ressaltou.

No aspecto do uso das folhas como fornecedoras de tinturas, os alunos abordaram as aplicações do urucum e do jenipapo entre os povos indígenas, além de observarem semelhanças artísticas com culturas africanas que utilizam tintas naturais em suas construções, como acontece na vila de Tiébele na Burkina Faso.

 

A literatura também esteve presente na hora de abordar as folhas. “Fizemos a leitura dos textos: “Obax”, de André Neves; “Andurá”, de Lucas Benetti e “Igbo”, de Marcos Cajé, nos quais observamos as relações dos personagens com a natureza e com as plantas, que são partes importantes em ambas as narrativas. Os alunos produziram pinturas, recontos, resumos e maquetes”, frisa Bárbara.

 

Folhas que preservam a vida

Dentro da proposta decolonial de educação, o projeto desenvolveu uma jornada rica e diversificada em torno do tema central das folhas, conectando as crianças a diferentes perspectivas culturais, científicas e artísticas. O trabalho começou com a reflexão sobre a folha como ser vivo, convidando os pequenos a plantar e acompanhar o processo de nascimento e crescimento das plantas no ambiente escolar. Essa vivência permitiu que eles se conectassem com os ciclos naturais e compreendessem o papel essencial dos vegetais na manutenção do ecossistema.

Os alimentos, por sua vez, abriram caminho para discussões sobre as folhas que comemos no dia a dia. Foram abordados pratos de origem indígena e africana, valorizando a sua presença na rotina das crianças e reforçando a importância de práticas alimentares tradicionais e saudáveis.

 

Folhas literárias

A literatura também se tornou um campo fértil para compreender as relações entre as folhas e a narrativa. As leituras das obras literárias citadas acima destacaram a conexão simbólica dos personagens com a natureza. A partir desses textos, os estudantes produziram pinturas, recontos, resumos e até maquetes, enriquecendo sua percepção sobre as plantas como personagens fundamentais nas histórias.

O projeto também promoveu uma reflexão sobre o trabalho das mulheres com as folhas, discutindo a figura da “bruxa” na literatura e no imaginário popular. As crianças aprenderam sobre rezadeiras e cientistas que, ao longo da história, usaram seu conhecimento de plantas para cuidar da saúde de comunidades, enfrentando preconceitos e estigmas.

 

A magia das folhas foi ampliada com a apresentação de seres mitológicos protetores da natureza. As abordagens em torno de Ceuci, deusa tupi-guarani das lavouras, e Ossain, entidade afro-brasileira ligada às folhas, mostraram às crianças como diferentes culturas integram elementos espirituais à preservação do meio ambiente, valorizando o respeito às crenças e tradições ancestrais.

Folhas culturais

Outra abordagem envolveu o estudo das formas de desenvolvimento das folhas, com foco nos cuidados com o solo na agricultura familiar e na importância dos alimentos orgânicos. As crianças analisaram os alimentos da merenda escolar e conheceram os calendários agrícolas indígenas e quilombolas, entendendo como essas culturas organizam o plantio e a colheita de maneira sustentável e respeitosa com o meio ambiente.

Na sequência, as folhas foram exploradas como matéria-prima artística. Ao estudar o uso do urucum e do jenipapo nas culturas indígenas e comparar com as pinturas naturais em vilas africanas como a de Burkina Faso, as crianças identificaram semelhanças entre diferentes tradições artísticas, ampliando seu olhar sobre as possibilidades estéticas das tintas naturais.

Por fim, o projeto destacou a relevância de instituições protetoras das folhas, como os quilombos e as aldeias indígenas. Através de fotos e vídeos, as crianças conheceram esses territórios e sua importância histórica e geográfica, compreendendo o papel crucial desses espaços na preservação da biodiversidade e no fortalecimento cultural. “Falei com meu vô que você, professora, fala de plantinha e ele mandou uma pra você”, disse Alisson da Conceição, do 1º ano, mostrando que, além de aprender, tornou-se um multiplicador de saberes. Já outra aluna foi categórica em afirmar o quanto a experiência foi única e prazerosa. “A tia faz uma aula legal, a gente faz coisas diferentes”, afirmou Nicole Borges de Oliveira, do 5º ano.

 

Conexão com a natureza

 

O que vemos é que a comunidade escolar como um todo percebeu a importância de um trabalho voltado para a conexão da criança com a natureza, identificando-se com os trabalhos apresentados. “O projeto de Educação Ambiental desenvolvido pela professora Bárbara tem sido de muita importância para os estudantes ampliarem seus conhecimentos sobre a influência dos povos originários, africanos e afro-brasileiros. Ao vivenciarem as culturas dessas etnias de maneira prazerosa, prática e lúdica, se percebem como parte do meio ambiente e se identificam com a cultura e os saberes transmitidos por seus ancestrais. É um projeto que transforma o olhar do estudante e sua relação com a natureza, levando todos a se sentirem como parte dela”, finaliza Ana Cristina de Lima Gomes, pedagoga da escola.


Por Antônia Figueiredo

 

Escola Municipal Professora Maria Felisberta Baptista da Trindade

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