Projeto estimula alunos a viajarem pela diversidade cultural dos estados brasileiros

Por Sandra Martins

Siriri, Cacuriá, Lundu, Balaio, Chula, Coco, Jongo. Nomes estranhos para muitos jovens acostumados a outros ritmos como o Hip-Hop ou mesmo pagodes de mesa. Estas são algumas das expressões musicais que formam o grande mosaico cultural brasileiro, com profunda influência das culturas africanas, encontradas ao longo das pesquisas desenvolvidas pelos alunos do Ensino Médio do Colégio Estadual Maria Terezinha de Carvalho Machado, do bairro de Jacarepaguá, na Zona Oeste, para o projeto Raízes: Negro na pele ou no sangue.

O nervosismo misturado à euforia impregnava o ambiente. Também não era para menos, a apresentação dos alunos marcaria uma dupla culminância: a do projeto propriamente dito, e o encerramento da trilogia iniciada em 2005. De acordo com a professora Elza Maria dos Santos, a idéia era ter uma macrovisão do século XX com três fases distintas, mas interligadas. “Esta perspectiva foi importante para que os alunos pudessem avaliar quais ícones marcaram cada década do século. O trabalho consistia em três partes: pesquisa, ornamentação e caracterização”.

Trabalhar temáticas africanas, que têm toda uma lógica mística, dentro da escola pública e laica suscitou, segundo o professor Fábio Gonçalves, de Artes, um olhar atento e uma preocupação constante na distinção da proposta do projeto que seria focar na cultura. “Comecei a induzir os alunos a explorar dois grandes artistas plásticos: Manoel Araújo e Picasso, porque retratavam o negro sujeito de ação e não o passivo, como mostrado nos estereótipos cotidianos”.

Ao focar no discurso cultural o professor tomou como estratégia a utilização das cores, apurando o olhar dos alunos para seu significado holístico no universo africano ressignificado em terras brasileiras. Ele dividiu as turmas em dois grupos: Máscaras de Picasso e Formas de Estamparias de Manoel Araújo. Produziram máscaras, tecidos, estilizaram indumentárias e fizeram pesquisas sobre as personalidades.

O projeto Raízes: Negro na pele ou no sangue envolveu todos os alunos daquela unidade escolar, cerca de 900 pessoas. As salas foram transformadas pelos alunos, sob orientação do quadro de professores, em cenários temáticos representando cada uma delas um estado brasileiro: Mato Grosso, Santa Catarina, Goiás, Pará, Maranhão, Ceará, Rio de Janeiro, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Amazonas, Alagoas, Bahia, Minas Gerais, Paraíba, Espírito Santo, Sergipe.

Quem visitou a sala de Mato Grosso ficou encantado com uma oca indígena e uma floresta com animais selvagens, que davam sinais da beleza exuberante deste estado da região Centro-Oeste e o clamor dos indígenas por respeito e valorização: “Índio: uma etnia que ainda precisa ser valorizada”. Uma das marcas do Carnaval de Olinda, os bonecos gigantes que arrastam milhares de foliões ao som do frevo abriram a apresentação da turma 1008. Para Karine Rodrigues Duarte, 15 anos, uma das coisas que mais a agradaram foi a vivência do trabalho em grupo.

A culinária paraense esteve muito bem representada pelo “pato no tucupi”, iguaria preparada por Elizabete Souza Barbosa, 31 anos, aluna da 1004, que mais tarde se juntou ao grupo para apresentar o “Carimbó”, dança de origem negra, surgida basicamente durante as festas em que os negros cultuavam São Benedito. Com o passar do tempo ela tomou feição menos religiosa e mais popular, passando a ser uma das principais danças praticadas em qualquer festa.
Enquanto apresentava a feijoada da sala-cenário do Rio de Janeiro, Bianca Cristina Mathias M. Pereira, 18 anos, ressaltou que projetos como este abrem as portas para outras informações. Como as infindáveis contribuições das culturas negras, que são muitas. Dos primeiros passos de gafieira, por exemplo, a jovem aluna agora vai fazer dança de salão e aprender os meneios dessa envolvente dança.

O Amazonas foi retratado pelo “boi” – todo bordado de miçangas – com direito aos tambores e às roupas. Elza Maria lembra que os alunos recorreram ao Museu do Folclore, ao Pavilhão de São Cristóvão e até à Secretaria de Cultura de Duque de Caxias, que prontamente os apoiaram emprestando os equipamentos necessários para a apresentação.

Para a pesquisa de Alagoas, os alunos traçaram um paralelo entre um de seus ilustres filhos – que personificou a luta pelos ideais de liberdade dos povos oprimidos – e o idealizador de um dos carnavais em que este personagem alagoano fora homenageado na Marquês de Sapucaí. O primeiro é Zumbi dos Palmares e o segundo é Martinho da Vila, autor do samba “Quizomba, a Festa da Raça”.

A criatividade foi a tônica das apresentações, algumas com temas mais inusitados enquanto outras se mostravam de forma mais moderada. No caso de Goiás, os alunos apostaram num drama shakespeariano na versão indígena, tendo como ingredientes amor, traição, vingança e suicídio. Já a equipe que representou o estado de Mato Grosso mostrou a dança do “Siriri”, de origem indígena. Santa Catarina apresentou o “Balaio”, dança trazida pelos colonizadores, de coreografia simples, entremeando sapateado, valsados e palmas.

A turma do Rio de Janeiro ousou com duas coreografias. Na primeira os passos foram embalados pelo “lundu” com a música “Pelo Telefone” de Donga e Mauro de Almeida, de 1916. O segundo momento se deu com os homens arrancando as gravatas e as mulheres jogando longe as saias (feitas de TNT) para dançarem uma gafieira ao som de “Homenagem ao Malandro” de Chico Buarque, na voz do maior malandro da música popular brasileira: Moreira da Silva.

Sergipe foi representado pelo “Coco”, dança muito conhecida no Nordeste. O “Caxambu” do Espírito Santo, nascido das senzalas, também deixou a sua marca. A Bahia foi homenageada com uma coreografia afromaculelê, mesclando maculelê, capoeira e gingado afro. A Paraíba apresentou uma “Quadrilha”, mostrando uma das maiores festas de São João do Nordeste. O encerramento ficou por conta do contagiante “Jongo” de Minas Gerais, manifestação cultural essencialmente rural diretamente associada à cultura africana no Brasil, e que influiu poderosamente na formação do samba carioca, em especial, e da cultura popular brasileira como um todo.





Colégio Estadual Maria Terezinha de Carvalho Machado
Coordenadora: Professora Elza Maria dos Santos
Endereço: Rua Cândido Benício, 826 –
Campinho – Rio de Janeiro/RJ
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Tel.: (21) 3015-1581
Fotos: Marcelo Ávila