Comprometida a casar-se com D. Álvaro, aventureiro português, Cecília, filha de D. Antônio de Mariz, chefe dos caçadores de uma colônia lusitana, enamora-se pelo índio Peri, líder da tribo Guarani. Em meio à disputa entre as tribos Aimoré e Guarani, Ceci é aprisionada pelos aimorés e o cacique destes, por sua vez, apaixona-se por ela. Pouco depois, também Peri é aprisionado pelos guerreiros. Ciente do amor entre Peri e Ceci, o cacique resolve sacrificá-los... Esse é um breve resumo da ópera O Guarani, do maestro e compositor Antônio Carlos Gomes, mundialmente conhecido como Carlos Gomes, encenada pelos alunos da classe de Educação Infantil, faixa etária de 4 a 6 anos, do Ciep 502, que funciona no Setor 6 do Sambódromo, no Rio de Janeiro.

Orquestrado pela professora de Educação Infantil Fátima Maria Gonçalves Moreira, o projeto Guaranizinho – A Ópera Infantil teve início no dia 19 de abril, data em que é comemorado o dia do índio. Um dos motivos que levou Fátima a escolher um tema indígena foi o fato de algumas crianças, mesmo vivendo na era da informação instantânea, conceituarem a figura do índio como algo distante, amedrontador e excluso da nossa cultura, apesar de eles (os índios) terem sido os primeiros habitantes da nossa terra.

“Após ouvir algumas opiniões dos alunos sobre os índios, tomei a decisão de desenvolver este trabalho, pois além de sua cultura riquíssima, o índio apresenta valores um pouco esquecidos nos dias atuais, como respeito, solidariedade e amor à natureza”,

esclarece, acrescentando que a segunda etapa do projeto foi a apresentação da música erudita às crianças, uma vez que a clientela da escola está totalmente voltada para um gênero musical bem diferente do proposto.

Depois de definir o tema, Fátima partiu para a fundamentação teórica, pesquisando todo material disponível em museus, sites, artigos, revistas especializadas, fitas VHS, Secretarias de Educação e muitos livros, entre eles: os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs (Ministério da Educa ção); A Marcha para o Oeste (Ed. Globo); O Guarani (Edições de Ouro); Carlos Gomes, uma obra em foco (Funarte); O Selvagem da Ópera (Ed. Companhia das Letras); Carlos Gomes, o compositor (Ed. Papirus); Carlos Gomes, uma paixão amorosa (Ed. Agir); e Sociedades Indígenas (Ed. Ática).

“Como o trabalho era destinado a crianças de uma faixa etária baixa, procurei ilustrar o projeto com objetos indígenas, livros de fotografias e todo recurso audiovisual disponível,” explica Fátima, relembrando que uma das primeiras atividades foi um passeio ao Museu do Índio, realizado no dia 19 de abril. Segundo ela, a visita foi muito valiosa para a composição do cenário do projeto. No museu, as crianças tiveram um primeiro contato com os artesanatos de diferentes grupos indígenas brasileiros. “No setor educacional, alugamos um kit escolar contendo livrinhos, carimbos, jogos e vários materiais sobre a cultura indígena, a fim de trabalharmos as histórias, as lendas, a pintura corporal, a culinária, o estilo musical e outros aspectos”, lembra Fátima.

 

 

No Teatro Carlos Gomes, os alunos apresentaram a coreografia Guaranizinho – A Ópera Infantil, um esquete da consagrada ópera O Guarani

 

 

“...O grande compositor fez o Guarani e nos presenteou...” (trecho da letra da música Samba para Carlos Gomes, apresentada no FECEM)

 

Desenhos, colagens e teatrinhos de fantoches de vara também fizeram parte do desenvolvimento do projeto

 

Estudantes conhecem um novo gênero musical durante a apresentação da Orquestra Sinfônica Brasileira

Àquela altura, alunos e professores já se sentiam meio branco e meio índio. Para reforçar esse sentimento, as crianças receberam a visita do Índio Carlos Tukano, que, vestido com trajes nativos, expôs vários objetos indígenas, fez demonstrações com arco e flecha, contou lendas e pintou as crianças com urucum – sementes de cor avermelhada comumente usadas como corante natural pelos índios. Foi um típico dia de índio, relata Fátima, recordando que, na ocasião, os alunos também fizeram esculturas e trançados com papel e folha de palmeira, manusearem o urucum e a argila, e provaram um prato típico dos povos indígenas: o biju.

 

Conhecendo as letrinhas

Em sala de aula, a professora começou a trabalhar a alfabetização dos alunos a partir de palavras ligadas ao projeto como, por exemplo, “A” de arvore, “B” de biju, “F” de flecha, “G” de Guarani, “I” de índio, “M” de milho, “O” de oca. Com a continuidade do projeto, várias disciplinas foram envolvidas. Em Matemática, foram trabalhadas noções de quantidade, adição e subtração, pesos e medidas.

 

 

A disciplina de Ciências foi usada para abordar as doenças de hoje e as antigas que dizimaram vários povos indígenas. Já a Geografia ajudou a identificar as aldeias indígenas, o Estado de São Paulo e a cidade de Campinas, terá natal do maestro Carlos Gomes.
Em História, além dos meios de transporte indígenas e europeus, retratou-se o descobrimento do Brasil pelos portugueses. O projeto incluiu, ainda, as disciplinas de Artes Cênicas e Plásticas, Língua Portuguesa e Música.

Durante o desenvolvimento do trabalho, as turmas da Educação Infantil também visitaram o Museu Histórico Nacional, o Teatro Municipal e a exposição Ticunas e Ianomâmis, realizada no CCBB. Nessa mostra, entre outras coisas, as crianças puderam conhecer de perto uma habitação indígena. No retorno à escola, Fátima trabalhou com a classe a importância da família e da moradia, e atribuiu-lhes a incumbência de construir uma maquete de uma aldeia indígena.

Para que as crianças pudessem entender, dentro do possível, as relações estabelecidas entre a esquadra de Cabral e os povos indígenas, naquela época, foi realizada a sessão cine-pipoca, com o filme, O Descobrimento do Brasil, cujo objetivo era mostrar que os índios foram os primeiros habitantes da nossa terra. Outro momento "escurinho do cinema", apresentado pela professora, foi o documentário Expedições e o filme Tainá, uma Aventura Amazônica. “A cada nova informação sobre a cultura indígena, a criançada, apesar da pouca idade, demonstrava total interesse”, disse Fátima.

Já familiarizados com a cultura indígena, os alunos foram remetidos ao universo da música clássica através da vida e da obra do maestro Carlos Gomes.

Antes da grande apresentação, alunos experimentam as roupas e acessórios de seus personagens

 

A apresentação do autor aos pequenos anfitriões foi feita através da leitura dos livros O Guarani, da Coleção Ópera Para Crianças – adaptação de Ruth Rocha – e Crianças Famosas, de Nereide Santa Rosa e Ângelo Bonito.

Depois de participarem atentamente da roda de leitura, os alunos ouviram canções do CD Ópera Infantil – A Orquestra dos Sonhos, do compositor Tim Rescala, e o prelúdio da ópera O Guarani. Nessa fase, eles conheceram um pouco mais da vida do autor, em especial, a sua amizade com o Imperador D. Pedro II e a sua trajetória pela Itália – país que adotou como segunda pátria.

Dentro desse contexto, foram trabalhados conteúdos, até então, desconhecidos pelas crianças, como a evolução dos meios de transportes; a localização dos países Brasil e Itália, através do globo terrestre; os aspectos econômicos da época do Brasil Império; e o Sistema de Governo da época. “Nesse período, também tivemos a grata felicidade de assistirmos à apresentação da Orquestra Sinfônica Brasileira, oferecida pela Secretaria Municipal de Educação, intitulada Concertos Didáticos”, frisa Fátima.

Com o auxílio da professora de Educação Musical, os alunos compuseram a música Samba para Carlos Gomes e participaram do Festival Estudantil da Canção das Escolas Municipais (Fecem), realizado no Teatro Carlos Gomes. No mês seguinte, a turma do Ciep 502 subiu novamente ao palco do Teatro Carlos Gomes, dessa vez, para apresentar a coreografia Guaranizinho – A Ópera' Infantil, um esquete da consagrada ópera O Guarani.

“Fizemos uma apresentação memorável, digna de grandes astros. As crianças se superaram. Cada uma que ali estava deu o melhor de si. Desde a montagem da coreografia, passando pelo figurino, todo preparado à mão, até os inúmeros ensaios que tivemos... foi tudo um desafio que juntos conseguimos vencer”, alegra-se a professora, garantido que esse trabalho começou pequeno e terminou grandioso.

Ao falar sobre os resultados do projeto, Fátima é categórica em afirmar que, além de adquirirem conhecimentos sobre a cultura indígena, a música clássica e sobre Carlos Gomes, o grupo se sentiu valorizado em poder representar a escola na Mostra de Dança e no Fecem. “Sem dúvida, esses alunos levarão para sempre em suas lembranças estes momentos, pois os vivenciaram de forma intensa”, finaliza Fátima.

 


Ciep 01.02.502
End.: Av. dos Desfiles, Setor 6 – Sambódromo –
Av. Salvador de Sá, s/n.º Estácio – Rio de Janeiro/RJ.
Tel.: (21) 3271-2211
Professora Fátima Maria Gonçalves Moreira