"O que a criança pode fazer hoje com o auxílio dos adultos poderá fazer amanhã por si só." Essa é a visão de uma mente brilhante que, em tão pouco tempo de vida, nos deixou uma reflexão que vem sendo trabalhada por nossos educadores e continuará por muito tempo em nosso campo educacional.

Buscando compreender o processo de desenvolvimento da aprendizagem e da consciência humana, Lev Semenovich Vygotsky tornou-se um dos mais importantes contribuidores das áreas de Psicologia e Educação.

De origem judaica, o professor, psicólogo e pesquisador nasceu em novembro de 1896, em Orsha na Bielo-Russia, e morreu aos 34 anos de tuberculose.

Sua família lhe proporcionou, em termos intelectuais, um ambiente propício a novas descobertas e aprendizados. Sua mãe, embora tenha dedicado parte de sua vida à criação dos filhos, era professora formada. Já seu pai, uma pessoa muito culta, trabalhava em um banco.

Até os 15 anos, Vygotsky estudou em casa com o auxílio de professores/tutores particulares. Muito dedicado aos estudos e com uma enorme curiosidade pelos diversos campos do conhecimento, tinha o costume de visitar a biblioteca pública e também a que tinha em sua casa. Seu gosto pela leitura era evidente, tão evidente que não se limitava a ler apenas os livros que tinham a tradução russa. O fato de ter estudado alemão, hebraico, latim, francês e inglês facilitava o acesso às literaturas estrangeiras.

Aos 18 anos, ingressou na Universidade de Moscou, onde estudou Direito e Literatura. Na mesma época em que cursava os dois cursos mencionados, também tinha sua participação na Universidade Popular de Shanyavski, nos cursos de História e Filosofia, porém, não recebeu nenhum título acadêmico por esses cursos.

No ano de 1924, em um dos principais encontros ligados à Psicologia - o II Congresso de Psicologia em Lenin­grado - Vygotsky ministrou uma palestra sobre o estudo do comportamento consciente humano, que encantou todos pela complexidade do tema apresentado.

Devido a este evento, foi convidado a trabalhar no Insti­tuto de Psicologia de Moscou e, logo após, fundou o Instituto de Estudos das Deficiências. Paralelamente a isso, por causa de suas investigações sobre os deficientes físicos e mentais, chegou a dirigir um Departamento de Educação, em Narcompros, voltado para este mesmo público.

Autor consagrado, Vygotsky começou a receber, a partir de 1932, duras críticas do governo de Stalin por considerar suas teorias idealistas. Nessa época, as idéias de Pavlov eram destacadas porque este defendia uma grande plasticidade e as potencialidades dos seres humanos diante das pressões do meio ambiente.


Ele até aceitava a idéia da plasticidade do homem mediante as influências da cultura, porém, era bem crítico à abordagem de Pavlov, uma vez que os seres humanos não podem ser analisados apenas em função de suas reações ao ambiente exterior. Na verdade, o que deve ser levado em conta é a maneira como os sujeitos criam o seu ambiente, dando origem a novas formas de consciência.

No Brasil, estudamos a teoria do psicólogo russo há pouco mais de uma década. Sua obra começou a ser divulgada nos anos 80, época em que a linha educacional construtivista se espalhava, direcionada por Emilia Ferreiro, discípula de Jean Piaget.

Apesar de terem vivido na mesma época, Piaget e Vygotsky não tiveram contato. No entanto, Vygotsky teve acesso aos trabalhos de Piaget produzidos na década de 20 e reconheceu a grandeza do método clínico sobre o estudo do Processo Cognitivo Individual e a semelhança de interesses no estudo da Gênese dos Processos Psicológicos, defendido por Piaget. Mesmo reconhecendo a riqueza do trabalho, Vygotsky fez críticas em relação à interpretação entre pensamento e linguagem.

Na teoria desse brilhante educador, fica em evidência a importância do envolvimento ambiental no desenvolvimento da criança e no processo de formação da mente. Para ele, outro aspecto importante é o fato de que o amadurecimento do pensamento acompanha o desenvolvimento da criança em suas diversas etapas de interação social.

Socioconstrutivismo

Quando falamos em Construtivismo, imediatamente nos vem a memória o epistemologista Jean Piaget. Dessa mesma forma, ao falarmos em Socioconstrutivismo, é inevitável lembrarmos de Vygotsky, que ressalta a importância das contribuições dos meios social e histórico no desenvolvimento mental, uma vez que o indivíduo não pode crescer fora de um ambiente cultural.
Gestos, hábitos, costumes, linguagens... Desde o nascimento, o bebê se integra a uma comunidade que orienta os rumos do desenvolvimento infantil. Uma poderosa "ferramenta cultural" é a linguagem, pois ela é capaz de modificar os rumos do desenvolvimento mental que é adquirido pela aprendizagem nas relações com os outros.

Para Vygotsky, as crianças nascem apenas com as Funções Psicológicas Elementares como, por exemplo, a atenção involuntária e os reflexos que estão também presentes nos animais mais desenvolvidos. Só com o decorrer do aprendizado cultural é que algumas dessas funções básicas transformam-se em Funções Psicológicas Superiores como, por exemplo, a tomada da consciência, a deliberação e o planejamento - características do homem.
A evolução intelectual, propiciada pela mudança de um nível de conhecimento para outro, só ocorre através do processo de relação do indivíduo com seu ambiente sociocultural e com a ajuda de outros indivíduos mais experientes - que podem ser o professor ou qualquer aluno de sua classe Esses indivíduos podem ser chamados de mediadores.

Zona de Desenvolvimento Proximal

Com a finalidade de explicar como ocorre esse processo entre o Desenvolvimento Real - que se refere àquilo que o indivíduo pode fazer sozinho - e o Desenvolvimento Potencial - que se refere àquilo que o indivíduo ainda não domina -, Vygotsky desenvolveu o conceito de ZDP - Zona de Desenvolvimento Proximal.

Embora, em princípio, esse termo pareça complexo, na realidade é de fácil compreensão, pois traz a idéia de que aquilo que a criança faz hoje com o auxílio de outros, amanhã, ela fará sozinha.

A aprendizagem interage com o desenvolvimento e, com isso, cria-se uma abertura nas Zonas de Desenvolvimento Proximal (distância entre aquilo que o aluno já sabe e o que ele é capaz de aprender com o auxílio de mediadores).


Sendo assim, não podemos esquecer que a aprendizagem ocorre pela assimilação consciente, ou seja, pela interiorização gradual da ação exterior.

É através do processo de internalização da interação social com materiais oferecidos pela cultura que se produz o desenvolvimento cognitivo, o qual se constrói de fora para dentro. O conhecimento se dá através de interações intra e interpessoais, pois é através da troca de experiências que o sujeito consegue formar um conhecimento.

A intervenção pedagógica interacional que propicia o processo ensino-aprendizagem ocorre na escola. Nela, o professor interfere nesse processo provocando em seus alunos avanços intelectuais como o auxílio da Zona Proximal. O aluno deixa de ser meramente um espectador de sua aprendizagem e passa a interagir com o meio, inicialmente com a formação de conceitos espontâneos e, depois, com os conceitos científicos que são adquiridos pelo ensino.

Fontes:

VYGOTSKY, Lev. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
VYGOTSKY, Lev. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
REGO, Tereza Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis: Vozes, 1995.
ANTUNES, Celso. Vygotsky em minha sala, quem diria? Petrópolis: Vozes, 2002.