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*Celso Antunes


Dona Wânia não gosta de aparentar a idade que tem e, por isso, está de parabéns. Em sua luta tirânica contra as rugas e contra a gravidade, vive “antenada” em todas as novidades que aparecem. Fala-se em botox e lá está ela querendo saber o custo e os riscos; menciona-se fios de ouro e lá vai ela tornar-se perita no assunto. Os resultados podem não ser esplendorosos e Wânia, em nenhuma circunstância, passa por garotinha de vinte e poucos anos, mas seu rosto, se não exibe a pele de pêssego que gostaria, esconde com dignidade os anos que acumulou.

Seu marido, o Stéfano, também não gosta de aparentar a idade que tem. “Não por vaidade”, segundo afirma, “mas para não aparentar diante dos alunos a falta de energia que tempos atrás sobrava”. Sua luta, entretanto, é diferente da de Wânia. Afinal, mantém-se distante de dermatologistas e cirurgiões plásticos e busca, toda manhã, “malhar” como conta-gotas na esteira e nas bicicletas ergométricas. Mesmo quando acorda cansado e com os músculos solicitando a doce trégua do repouso, cerra os dentes e faz sua caminhada, finge força e malha para valer.

Wânia e Stéfano possuem objetivos análogos, mas buscam alternativas diferentes. A esposa acha que as tentativas do marido são maluquices e coisa de “velho doido”. O esposo, por sua vez, que financia as plásticas, acha que o caminho buscado pela mulher “é apenas exterior” e reclama sua companhia nas atividades aeróbicas.

Assim como Wânia e como Stéfano, existem muitos professores preocupados em se modernizar e não ministrar aulas, hoje, como o faziam há vinte anos. Sabem que o tempo mudou, que o construtivismo chegou, que as competências são faladas em toda parte e não desejam ser vistos pelos alunos e pelos pares como professores do passado, que pensam que ministram aulas para alunos que já não existem mais. No entanto, tal como Wânia e como Stéfano, esses professores trilham caminhos diferentes.

Alguns enfeitam suas aulas com “plásticas”, modernizam sua conduta apenas por fora. Adotam um novo método aqui, substituem por outro ali, encantam-se hoje com Freinet, amanhã com Piaget, exploram Gardner e discutem Perrenoud,



mas, no íntimo, ainda acreditam que não pode existir aprendizagem sem “silêncio sepulcral” e que os saberes lhes pertencem, entrando na cabeça dos alunos tal como “água mole em pedra dura”...

Suas aulas e suas provas, ainda que enfeitadas com recursos da multimídia, exigem memorização disfarçada e somente acreditam que seus alunos efetivamente apreenderam quando puderem reproduzir suas lições da forma como as enviaram. Suas ações possuem cara de modernidade e suas estratégias, tal como o botox, escondem as rugas, mas não ocultam a verdade do envelhecimento.

Outros professores já preferem ser como Stéfano. Não se incomodam com a aparência e nem mesmo se ofendem quando são citados como dinossauros. Sabem, entretanto, que suas aulas se escoram em uma aprendizagem efetivamente construída e suas interrogações levam sempre seus alunos em busca de significações. Alternam formas de aula, pois sabem que circunstâncias diferentes exigem ferramentas desiguais, e suas provas, ainda que com aparência antiga, interrogam e conduzem os alunos a analisar, sintetizar, descobrir, criar, enfim, efetivamente, pensar.

É certo que, em nosso ensino, não existem apenas Wânias e Stéfanos, mas é evidente que há bem mais Wânias que Stéfanos. Afinal, é mais confortável repousar em berço esplêndido com rodelas de pepinos sobre os olhos do que o árduo combate contra a esteira ou contra os morros nas dolorosas, mas sempre eficientes caminhadas.


*Celso Antunes é bacharel e licenciado em Geografia pela Universidade de São Paulo, Mestre em Ciências Humanas, Especialista em Inteligência e Cognição, membro consultor da Associação Internacional pelos Direitos da Criança Brincar, reconhecido pela UNESCO, autor de cerca de 180 livros e consultor de diversas revistas especializadas em Ensino e Aprendizagem.

E-mail: celso@celsoantunes.com.br
Site: celsoantunes.com.br