
Este texto teve sua origem na necessidade de responder a duas perguntas:
qual a razão e a finalidade de o professor planejar suas aulas? O lugar
que pertence ao aluno e ao professor, o papel que cada um vai desempenhar
na sala de aula está relacionado ao entendimento de como ocorre a aprendizagem
por parte do aluno. Se concebida numa perspectiva teórica construtivista,
a aprendizagem é compreendida como um resultado do esforço de atribuir
e encontrar significados para o mundo. Esse esforço exige construir e
revisar hipóteses sobre o objeto do conhecimento. Na escola, o aluno compara,
revisa e constrói esquemas de conhecimentos sobre os conteúdos escolares.
A aprendizagem é resultado da atividade do sujeito que aprende no plano
do meio físico e no plano das idéias, ou seja, da reflexão sobre a ação
e seus resultados, e depende do desenvolvimento das suas estruturas cognitivas
e dos seus conhecimentos prévios. Por outro lado, a teoria de Vygotsky
atribui um papel especial ao meio social, ao adulto, no processo de aprendizagem.
O conceito de “zona de desenvolvimento proximal”, que é a distância entre
o nível de desenvolvimento real e o nível de desenvolvimento potencial
da criança, explicita a possibilidade que o aluno tem de resolver problemas
e aprender sob a orientação de outros; na escola, de modo especial, sob
a orientação do professor. Se aceitarmos que o processo de aprendizagem
se desencadeia a partir da necessidade, do conflito, da inquietação, a
partir de situações de desequilíbrio (Jean Piaget), o professor tem o
papel de desestabilizador, de quem instiga a dúvida e desafia, instalando
no aluno a pergunta, embora, também, organize as condições para o aluno
elaborar respostas para suas hipóteses.
Numa perspectiva construtivista, podemos dizer que o professor é o centro
do processo de ensino, pois precisa dirigir, definir objetivos e os rumos
da ação pedagógica, responsabilizando-se pela qualidade do ensino. O aluno,
por sua vez, é o centro do processo de aprendizagem, pois deve estar sempre
mobilizado para agir no plano do real e no plano das idéias. Em sala de
aula, ele precisa ser desafiado a lançar hipóteses sobre atos, problemas,
fenômenos etc. e também a testá-las em busca de respostas, de conhecimento.
O aluno conhece se esse ato for constituído por um conteúdo e por uma
forma de apreender e de se apropriar, ato que se efetua mediante a relação
entre professor e aluno. Aprender depende de conteúdos, de objetivos e
de uma forma que faça o aluno entrar em relação com o conhecimento. Isso
implica conteúdos e atividades que enfatizem a curiosidade, o questionamento
e a reflexão. Não basta pôr o aluno diante de conteúdos para aprender.
É preciso que sejam dispostas situações, atividades, condições que desencadeiem
o processo de relacionar o conhecimento antigo com o novo. A aprendizagem
ocorre se o aluno atualiza seus esquemas de conhecimento, se os compara
com o que é novo, se identifica diferenças e semelhanças e as integra
ao que já sabe, porque estabelece relações entre o que já faz parte de
sua estrutura cognitiva e os conteúdos que lhe são ensinados.
O professor, ao articular essas condições, exerce o papel de mediador.
Conseqüentemente, é necessário ter claras as intenções e os significados
das mediações que se processarão por meio de suas intervenções. A natureza
das intervenções feitas estabelece os limites e as possibilidades pelas
quais o aluno poderá se mover, lançando mão de ações físicas e mentais
na busca de respostas. As intervenções pedagógicas podem ser concebidas
como ajuda adaptada ao processo de construção, que é do aluno.
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Considerando
o que foi dito, é possível afirmar que o professor tem um papel ativo
no processo de aprendizagem do aluno. Planejar intervenções é competência
do professor. Intervenções adequadas são aquelas que permitem ao aluno
fazer muitas relações.
Ao definir e articular conteúdos, objetivos e a forma de ensino que põe
o aluno em relação com o conhecimento, o professor está organizando suas
intervenções e planejando suas aulas. É necessário escrevê-las, para que
as decisões sirvam de guia para a ação em sala.
Para adotar uma forma de provocar a relação do aluno com a informação
e com o conteúdo, de modo que ele possa transformá-lo em conhecimento,
o professor precisa estar ciente de que a organização do ensino é delineada
com base no conhecimento do nível de desenvolvimento do aluno e em seus
conhecimentos prévios, no contexto em que atua, nos objetivos pretendidos,
na natureza do conteúdo e em suas concepções de educação, de homem, de
sociedade, de como o aluno pensa e aprende. A forma de intervir basear-se-á
em propostas, situações, atividades, conversas, argumentações, tarefas,
jogos etc. que exigirão do aluno, entre outras coisas, a proposição de
hipóteses, a resolução de problemas, a análise de acontecimentos, fatos,
fenômenos, a classificação, ordenação, a leitura, a escrita, a interpretação,
o estabelecimento de relações etc. Essas ações estão implícitas nas propostas
do professor, de tal modo que é o aluno quem estrutura a solução mediante
sua atividade física e mental.
O adequado é organizar uma seqüência de ações, situações e atividades
que serão desenvolvidas durante os encontros com os alunos, porque o processo
de estabelecimento de relações para elaborar conhecimento é organizado,
contínuo e dinâmico, como uma espiral.
Se o objetivo é que o aluno aprenda, planejar aulas é um compromisso com
a qualidade das intervenções realizadas em sala de aula.
Célia Maria Guimarães,
mestre e doutora em Educação pela Universidade Estadual Paulista (Unesp),
é professora do Dept.º de Educação da Faculdade de Ciências e Tecnologia
da mesma universidade. Ministra aulas no curso de Pedagogia, na habilitação
para o magistério em Educação Infantil, no curso de pós-graduação “Formação
de Professores”, em nível de mestrado, e coordena o curso de pós-graduação
(lato sensu) “Formação de Recursos Humanos para a Educação Infantil”.
OBS.: Matéria Cedida pela revista Páginas Abertas.
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