Saúde da coluna também se aprende na escola

Por Tony Carvalho

Cadernos, livros, estojo, agenda e... quando o aluno percebe, sua mochila já está com o peso bem acima do recomendável. Esta cena acontece diariamente com grande parte dos estudantes brasileiros. Como as escolas em geral não possuem armários para que seus alunos guardem o material de estudo, as mochilas são os acessórios mais usados por crianças e adolescentes. Uma mochila muito pesada pode não causar grandes problemas num dia, mas o uso contínuo pode provocar até lesões na coluna vertebral. A criança que carrega peso em excesso e caminha bastante até chegar à escola, ou sobe e desce escadas, pode apresentar alterações que vão desde contraturas musculares lombares até deformidades estruturais, alertam ortopedistas. Tudo depende do peso do material transportado e da constituição física do estudante.

Mas, pelo menos, para os alunos do CIEP Heitor dos Prazeres, localizado em Pedra de Guaratiba, no Rio de Janeiro, esta história começa a mudar. Eles estão participando de um projeto pioneiro implantado pelo professor de Educação Física e fisioterapeuta Francisco Miguel Pinto. Trata-se do Programa de Educação Postural na Escola. Aos poucos, os jovens estão se conscientizando dos riscos da coluna e passando a adotar uma mudança de atitude. “Ao reaprender a andar, sentar e até dormir, os estudantes estão não apenas tomando uma consciência corporal, mas também melhorando até mesmo sua auto-estima”, esclarece o professor.

Miguel ministra palestras e dá aulas para o Ensino Médio. Sua disciplina tem o nome de Promoção da Saúde. No início do ano, durante as palestras, ele seleciona os alunos com alterações de postura. Aqueles que apresentam problemas mais graves são aconselhados a procurar um ortopedista. Aos pais são encaminhadas fichas de avaliação com indicações de tratamentos. Já os estudantes que apresentam apenas a má postura funcional, o desleixo do dia-a-dia, são orientados a participar da ginástica postural.

O trabalho dura, em média, de três a seis meses, dependendo do grupo. A palestra aborda desde a anatomia da coluna aos principais desvios e também ensina como se deve andar, dormir, sentar-se e carregar a mochila. A segunda etapa é avaliar quais alunos apresentam problemas.

Eles passam pelo simeógrafo, um sistema de avaliação das simetrias musculares, criado por Miguel. A etapa seguinte é a pesagem da mochila. O aluno só pode carregar 10% do peso do seu corpo, ou seja, se ele pesar 50 quilos, por exemplo, sua mochila não poderá passar dos cinco quilos. “O principal problema é a cifose, a curvatura da coluna. Mesmo com uma mochila leve, a tendência é o estudante curvar os ombros para frente. É preciso corrigir esta postura”, adverte. A quarta etapa é a ginástica postural, feita numa sala apropriada.

O mochilômetro é um programa de computador que atribui a cada material escolar um peso e informa se a pessoa pode, ou não, vir a ter problemas de coluna. Na adaptação do professor Miguel, o mochilômetro passa a ser uma balança na qual é registrado o peso do aluno e da mochila. Em seguida, o professor avalia como o estudante transporta a mochila. “O ideal é variar a forma de carregá-la, de preferência fazendo uma tabela. Um dia, levando-a no ombro direito; outro dia, no esquerdo. No dia seguinte, a mochila deve ser carregada atrás, depois na frente”, aconselha.

Mas o programa vai além do tempo dedicado à sua disciplina. Miguel conseguiu fazer com que os professores da escola aderissem às sessões de alongamentos. A cada hora de aula, eles interrompem as atividades e, junto com os alunos, realizam cinco diferentes tipos de alongamentos.

Os exercícios não levam mais do que 50 segundos e ainda ajudam a afastar o cansaço. “Em todas as técnicas de educação postural, os exercícios corretivos buscam o reequilíbrio da postura. O indivíduo assume uma posição errada durante muito tempo e o corpo acaba assimilando, de uma forma inconsciente, um padrão postural inadequado. Por isso, a cada hora, são feitos alongamentos, que defino como a higiene da coluna. Os exercícios proporcionam distensões musculares, afastamentos proporcionais das vértebras e relaxamento da musculatura, ativando a circulação sangüínea em outros pontos. Depois de uma hora, voltamos a fazer uma nova sessão de alongamentos. Aqui na escola já virou hábito. Descontrai a aula, integra o aluno e faz com que ele saia daquela postura errada que inconscientemente adotou”, define.

“É um método que veio para revolucionar, pois os alunos ficam sentados durante um bom período. Isso faz com que a aula se torne mais dinâmica. A tendência é o aluno se soltar, ficar mais receptivo. Para o professor também é benéfico porque corrige sua postura diante do quadro. Eu tenho feito esta proposta em outras escolas que leciono e estou conseguindo bons resultados”, diz Marcos do Nascimento Santana, professor de Língua Portuguesa e Literatura.

Alexandre Mota, professor de Biologia, aplica os exercícios durante as suas aulas desde o ano passado e garante que, além do lado terapêutico, há também o lado lúdico. “Passar uma hora e meia (dois tempos conjugados) sentados em uma cadeira não é nada confortável. Os alunos assimilaram bem os exercícios que acabaram se tornando um momento de descontração”, conta.

A escola está ajudando a mudar o comportamento postural da comunidade. Ângela Lúcia, coordenadora pedagógica, revela que o programa desperta o interesse não apenas dos alunos, mas também de pessoas que estão vindo participar de atividades específicas para esse público. “Além da avaliação postural, o trabalho de promoção de saúde da escola inclui oficinas de combate às drogas e orientação sexual. O programa entrou no projeto político-pedagógico e foi inserido na grade curricular do Ensino Médio” justifica.

Desde 2002, a Lei n.º 3775, de autoria do deputado Bernard Rajzman, trata da criação do programa de prevenção, acompanhamento e tratamento dos problemas de desvio na coluna vertebral, nas escolas da rede pública estadual. Contudo, a lei parece não ter saído do papel e a maioria das escolas ainda desconhece o seu conteúdo.

Dentro do programa, os alunos ainda estão desenvolvendo a criação de uma cadeira ergonômica. A idéia é, até o final do ano, finalizar o protótipo, para que um engenheiro da área ergonômica dê um parecer. Caso seja aprovado, Miguel garante que tentará o patrocínio de uma empresa para a instalação de salas ergonômicas na rede estadual.

CIEP Heitor do Prazeres

Tel.: (21) 3155-8102
Professor Francisco Miguel Pinto
Consultorias e palestras:
Escola de Postura
Tel.: (21) 2415-6768
E-mail: francismiguel@aol.com

DOENÇAS QUE OCORREM NA COLUNA VERTEBRAL


Cifose:
caracteriza-se pelos ombros caídos e pela acentuada curvatura da coluna vertebral.

Lordose:
neste tipo de deformação, ocorre uma grande curvatura da coluna vertebral para frente. O peito e a barriga também ficam projetados para frente.

Escoliose:
é o desvio da coluna vertebral para um dos lados do corpo. Posturas incorretas repetitivamente ao sentar podem causar escoliose.

 

CERTO:
ERRADO: