Edição 35 - A Gente Não Quer Só Comida

Por Jaciara Moreira

Unir a prática de esporte à preservação ambiental. Com esta proposta, o professor de Educação Física José Ricardo da Silva Ramos criou o projeto pedagógico Esportes Ecológicos e Educação Ambiental: Construindo a Escola Cidadã a Partir da Educação Física. A idéia foi implantada na Escola Municipal Brigadeiro Nóbrega, localizada na Vila do Abraão, Ilha Grande, em Angra dos Reis.

Cerca de 100 alunos de 6.ª e 7.ª séries do Ensino Fundamental foram incentivados a cuidar da natureza enquanto praticavam esportes como natação, escalada, caminhadas, atletismo, rapel e surfe. A aceitação foi tão boa que professores de outras disciplinas decidiram integrar o projeto, que foi lançado no ano passado e voltou a ser aplicado agora.

“A diretora e a orientadora pedagógica da escola gostaram da idéia de ter a questão ecológica como eixo principal de um programa pedagógico e motivaram os professores a fazer encontros sobres temas ligados à realidade da comunidade onde a escola está localizada”, explica Ramos.

Segundo o professor, Ilha Grande enfrenta vários problemas ambientais como desmatamento, construções irregulares, valas negras e poluição das praias. E foi essa degradação que o levou a criar o projeto.

“Nosso objetivo era resgatar a função conscientizadora da escola no seu espaço social por meio do seu envolvimento com a natureza local”, completa o educador.

Depois de alguns encontros entre o corpo docente, o projeto tornou-se interdisciplinar. O conteúdo central, conforme ressalta Ramos, continuou sendo o esporte. No entanto, ele se desdobrou em outros conteúdos que deram ao aluno a oportunidade de adquirir novos conhecimentos como, por exemplo, o vocabulário específico de um determinado esporte e a dinâmica das transformações ocorridas na natureza e no ecossistema local. Para isso, a interação com disciplinas como Português, Matemática, Artes, Biologia, Geografia e História foi fundamental. Nas aulas de Língua Portuguesa, por exemplo, além de pesquisar o significado das novas palavras que aprendiam, os alunos produziam textos e poesias sobre o meio ambiente. Com a professora de Artes, confeccionaram placas de sinalização para as trilhas ecológicas. E, por meio dos conhecimentos de Geografia e de História, fizeram mapas e levantamentos da ilha onde a escola está localizada. Nem mesmo o Inglês ficou de fora do projeto. As noções do idioma ajudaram os estudantes a preparar panfletos que foram distribuídos aos turistas, chamando a atenção deles para a importância da preservação ambiental.

“A experiência vivenciada pelos alunos com o esporte ecológico foi o ponto de partida para a seleção dos conteúdos de cada disciplina. Isso ajudou-os a compreender o que acontece na comunidade onde vivem, além de estimular o diálogo e a integração entre professores de diferentes áreas”, comenta Ramos.

Segundo o professor, a ação interdisciplinar do projeto contribuiu para a formação do que ele chama de uma “escola cidadã”, ou seja, com participação efetiva no processo de educação ambiental dos seus alunos. Como exemplo, ele cita o comentário da estudante Carolina da Conceição, 15 anos, da 7.ª série: “Que maravilha quando fazemos esportes e ao mesmo tempo nos conscientizamos da importância de cuidar do nosso ambiente”. Outra adolescente, Camila Oliveira, 14 anos, da 6.ª série, mostrou seu entusiasmo com a poesia Beleza da Ilha Grande: “Para não perdermos essa beleza/ Para não jogar o lixo na mata/ E nem sujar o mar/ Para isso vou te convidar/ Você aceitará?”

Didática

O projeto pode ser desenvolvido durante todo o ano letivo. Nos primeiros meses (fevereiro e março), a principal tarefa dos alunos é vasculhar os jornais da região e identificar os problemas ambientais mais graves. Com o resultado da pesquisa, é montado um roteiro de trabalho e um mural. A partir daí, o professor de Educação Física inicia o seu trabalho. Os exercícios físicos são elaborados para levar os estudantes aos locais onde há danos à natureza, e é desses lugares também que saem as informações para as outras disciplinas.

De acordo com o professor, as aulas se tornaram mais ricas à medida que os alunos foram desafiados a escalar montanhas, a descer seis metros de uma parede de pedra pendurados em uma corda ou a limpar a areia da praia como aquecimento para uma aula de natação.

“A repercussão positiva do projeto ecológico ficou comprovada quando os estudantes decidiram realizar o I Festival de Atletismo Ecológico da Ilha Grande que passou a fazer parte da grade curricular da escola”, comemora o educador.

Não há, no projeto, a pretensão de avaliar os participantes. Tudo que os professores esperam com ele, conforme justifica Ramos, é conseguir formar cidadãos mais conscientes em relação à preservação ambiental. “Esse projeto envolve um tema transversal, portanto, não tem obrigatoriedade de emitir conceitos. A avaliação do aluno fica a critério do professor. Portanto, se achar que, pelo envolvimento com o projeto, o aluno merece alguns pontos a mais, ele pode dar. No entanto, nossa proposta não é estabelecer qualquer tipo de avaliação tradicional para que o aluno cumpra uma etapa escolar”, afirma.

Aprendizado

“O nosso projeto interdiciplinar criou uma oportunidade privilegiada para resgatar o desejo de aprender”. Assim, Ramos avalia o programa pedagógico. Ele considera que, além de se interessarem mais pelas aulas, os alunos passaram a ser vistos como produtores de conhecimento à medida que, a partir de experiências vividas com a prática de exercícios físicos, passaram a saber mais sobre a comunidade onde vivem e apresentaram suas descobertas aos professores. “Foi uma troca muito rica”, acrescenta o professor.

Ele destaca a questão ambiental como uma das principais preocupações mundiais de hoje e defende que a escola, “como parte integrante de uma comunidade e como formadora de cidadãos, tem que se envolver com o tema”.

Professor José Ricardo Ramos
Tel.: (21) 2712-3270