Por Andréia Brilhante

Para uma platéia repleta de professores, Hamilton Werneck falou sobre as perspectivas do professor do futuro: “ele deve ser criativo, talentoso, sem mordaça na boca, usuário do computador, conhecedor de um segundo idioma, capaz de resolver conflitos, pensar e sentir, adiar a satisfação e conviver com a frustração”

A educação, no Brasil, ao contrário do que se pensa, gera grande interesse e é motivo de esperança. Foi o que comprovou o IV Congresso ABEU de Educação do Grande Rio, realizado no RioSampa, em Nova Iguaçu, nos dias 22 e 23 de setembro. O evento, cujo tema foi “Educação Gera Paz e Amor”, reuniu cerca de 1200 pessoas, na maioria professores e alunos, e transformou a casa de shows em palco do conhecimento.

O congresso teve como palestrantes o psicólogo e antropólogo Roberto Crema; o secretário de Educação de Nova Friburgo, Hamilton Werneck; o doutor em Teologia Leonardo Boff e a doutora em psicologia Thereza Penna Firme. Também marcaram presença no evento seu coordenador, o professor Júlio César, a pedagoga Maria Helena Alves Carreira, idealizadora do congresso, e o diretor Social da Appai e do Jornal Educar, professor Ednaldo Carvalho.

Abrindo os trabalhos, o presidente da Associação Brasileira de Ensino Universitário (Abeu), professor Valdir Vilela, explicou, aos presentes, como a associação pode contribuir para melhorar a educação. “A Abeu tem por meta garantir maior organização ao ensino. É um esforço grande, mas que só beneficia a Educação, que está um caos. Daí o nosso interesse nas novas linhas que surgem e modificam a educação”, disse Valdir Vilela, ressaltando que todo ano será realizada uma nova edição do congresso ABEU, para trazer renovação à área.

 

Em seguida, o prefeito de Nova Iguaçu, Nelson Bournier, deu as boas-vindas aos congressistas, falando sobre a importância de a ABEU realizar eventos relevantes para o aprimoramento e a capacitação dos professores.

O professor Ednaldo deixou claro por que na Educação reside a esperança por um mundo melhor. “Em 160 anos, a população mundial aumentou em quase 4 bilhões de habitantes e, ao adentrarmos o terceiro milênio, seremos mais de 6 bilhões de seres humanos sobre o planeta Terra, dos quais 70% viverão em condições de exclusão social. Creio que uma educação centrada na fraternidade é o instrumento do aprimoramento civilizatório, o que deverá encurtar as desigualdades sociais, promovendo mais justiça entre os homens”, disse ele.

Educação centrada na inteireza

O psicólogo, antropólogo, escritor e vice-reitor da UNIPAZ, Roberto Crema, abordou o tema Educação Centrada na Inteireza, isto é, que desenvolve não só o cérebro, mas também a parte psíquica do homem. “Não é possível haver uma educação baseada na inteireza sem resgatarmos a educação centrada na espiritualidade, a educação transreligiosa. Espiritualidade é consciência de participação, comunhão que, na essência, traduz-se por amor e, na prática, por solidariedade. Todas as escolas deveriam existir para ensinar o aluno a escutar. Tudo começa pela escuta”, disse.


Em outro momento, Roberto Crema falou sobre a normose, definida como a doença da normalidade. O psicólogo explicou que normótico é quem passa sempre pela mesma rua, cai nos mesmos buracos e nunca assume a responsabilidade. “Se o dominante na sociedade fosse o amor, a paz, seria muito bom ser normótico. Mas há 4 bilhões de excluídos do processo civilizatório e cada um de nós é responsável. Se não for você, quem será? Se não for aqui, onde começar ? Se não for agora, quando tomar uma atitude?”, provocou a platéia.

Reflexão pedagógica e auto-estima do professor

Bem-humorado, o secretário de Educação de Nova Friburgo, escritor e especialista em administração escolar e orientação educacional, Hamilton Werneck, , levou o público a refletir sobre a auto-estima do professor. Para isto, enumerou os três pecados capitais da Pedagogia, causadores da baixa auto-estima do educador: saber e não ensinar; ensinar e não praticar; ignorar e não perguntar. Ele fez uso de slides e músicas relacionadas ao assunto para complementar a exposição. E enfatizou: “Quando o professor ensina e sente que as pessoas aprendem, sua auto-estima sobe. Se o aluno não aprende, ele e o aluno ficam frustrados. É preciso falar a linguagem do aluno”.

Hamilton Werneck explicou, ainda, como deve ser o professor do século XXI: criativo, talentoso, sem mordaça na boca, usuário do computador, conhecedor de um segundo idioma, capaz de resolver conflitos, pensar e sentir, adiar a satisfação e conviver com a frustração.

Avaliação na escola

A doutora em psicologia e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Thereza Penna Firme, falou, ao público, sobre a importância da avaliação. “A pesquisa descobre o mundo, a avaliação melhora o mundo. A avaliação ilumina, mostra por que alguém foi bem ou teve dificuldades. Quando alguém nunca se avaliou, sucumbe, toma um susto quando recebe uma crítica”, explicou.

Segundo a professora, o aluno busca avaliações rápidas e correções simples. “Quando ele se sente discriminado através da avaliação que não respeitou a ética ou a sua auto-estima, acredita que é incapaz. O avaliador deve saber perguntar na hora certa, ter integridade, honestidade, responsabilidade pelo bem-estar geral. Avaliação não é medo, é coragem; não é classificatória, é promocional; não é arbitrária, é criteriosa; não é autoritária, é participativa; não é secreta, é transparente; não é imposição, é negociação”, explicou Thereza, que arrancou aplausos da platéia.

Educar para saber cuidar: a ética do humano

A palestra do doutor em Teologia e Filosofia, escritor e professor Leonardo Boff foi centrada nos mecanismos necessários à construção da paz. “Paz é o equilíbrio do movimento. Não é cruzar os braços. Não queremos a paz dos cemitérios, a tranqüilidade das tumbas”, disse. E apontou o capitalismo como o elemento destruidor da paz. “Há uma ‘hamburguerização’ do mundo. Este processo econômico, político e cultural nega a paz, a vida. Muitos empregos são destruídos pela automação do robô, do computador. O processo mundial traz ruptura de paz no sistema da vida e da natureza. Por ano, desaparecem 1000 espécies de vegetais”, afirmou. Leonardo Boff mencionou a competitividade como uma das responsáveis pelo caos. “Nossa estratégia, na busca pela paz, é anticultural. Esta cultura que está aí trabalha contra nós, num consumo que estimula a violência. É uma sociedade competitiva e não cooperativa. O que traz paz é a cooperação”.

Para o teólogo, desenvolver o interior é fundamental no processo de busca pela paz. “Se queremos ser instrumentos de paz, devemos ser pacificadores conosco mesmos. Dentro de nós, habitam demônios ferozes. Eu posso ser um bandido, mas também posso ser generoso. Depende de nós, de onde vamos colocar o acento. Precisamos controlar, domesticar os demônios. A paz vem de somar, dar as mãos”, disse ele. E mobilizou o público para que todos cantassem juntos a Oração de São Francisco: “Senhor, fazei-me um instrumento de vossa paz...”