A Educação é uma questão de direitos humanos, e os indivíduos com deficiên-cias devem fazer parte das escolas, as quais devem modificar seu funcionamento para incluir todos os alunos". Transmitida durante a Conferência Mundial de 1994 da Unesco, sobre necessidades educacionais especiais, esta mensagem vem nos alertar quanto à urgência de pôr em prática a Educação Inclusiva, ou seja, tornar a escola um local acessível e que ofereça ensino de qualidade a todas as crianças e jovens, inclusive portadores de deficiências. No entanto, tal realidade ainda é utópica em nosso país, onde são incontáveis os deficientes físicos e mentais fora do ambiente escolar ou dentro dele vivendo segregados, excluídos do grupo considerado normal.

A Educação Inclusiva defende que todas as crianças, independentemente de talento, deficiência, origem sócio-econômica ou cultural, estejam em sala de aula e suas necessidades sejam satisfeitas. Afinal, educar de verdade não pode significar discriminar socialmente, excluir. É o que comprovam os raros exemplos daqueles que abraçaram a causa da inclusão, apesar da falta de apoio, de recursos e do preconceito da so-ciedade e de educadores.

A luta pela inclusão

Negar à criança o acesso à Educação é negar-lhe a oportunidade de aprender. É ir contra a Constituição brasileira, em seu artigo 6º, que garante o direito à Educação a todos os cidadãos. Além do mais, quem está apto a julgar se uma criança tem ou não capacidade de aprender, se este ou aquele jovem saberá conviver em um ambiente escolar?

Hoje, grupos isolados de instituições sem fins lucrativos tentam incluir crianças e adolescentes na estrutura educacional. Paralelamente, pais e responsáveis lutam por um espaço, no ambiente escolar e na sociedade, para seus filhos e familiares portadores de deficiência. Eles sabem que, quando uma criança recebe estímulos e recursos, absorve os conteúdos que lhe são transmitidos. Basta que lhe dêem a oportunidade de estudar, o educador conheça as diferenças entre ela e outros alunos, sabendo respeitá-las, e a escola desenvolva ações que favoreçam a todos.

É fato que não se pode precisar as condições físicas e mentais de uma criança. Muitas vezes, ela nos surpreende com a superação de suas deficiências e as suas conquistas. É o caso de Rossana da Rocha Frasso Correia, de 19 anos, portadora de paralisia cerebral, tipo Pigar 1. Concluindo o terceiro ano da Escola Normal Heitor Lyra, a jovem está pronta para formar-se professora primária. Mas, para chegar aonde chegou, Rossana e sua família tiveram que derrubar barreiras, principalmente a do preconceito. "Na escola, a maioria dos professores não acreditava que eu conseguiria concluir o Curso Normal e alguns deles ainda não confiam totalmente na minha capacidade profissional".

Rossana comprova o contrário. Além de estar concluindo terceiro ano, já trabalha como colaboradora na turma de Educação Infantil da Escola Jardim Infância Pirralho, situada em Vaz Lobo, bairro da Zona Norte do Rio de Janeiro. A única diferença entre Rossana e seus colegas de classe, hoje, é que, além de ter superado sua deficiência, a aluna superou o preconceito e a incredibilidade de professores que desconheciam suas reais habilidades e sua determinação. É verdade que, durante algum tempo, Rossana precisou de tratamento espe-cial. No início da fase escolar, tinha grande dificuldade para comunicar-se e andar. Por isto, precisou repetir, por três vezes, a Classe de Alfabetização. Depois, não parou mais. Atualmente, Rossana prefere chamar sua "deficiência" de diferença.

Já dizia o especialista Hagberg, em 1975, que a paralisia cerebral é definida por um prejuízo permanente do movimento ou da postura que resulta de uma desordem encefálica não-progressiva. Esta desordem, segundo ele, pode ser causada por fatores hereditários ou eventos ocorridos durante gravidez, parto, período neonatal ou os dois primeiros anos de vida.

Em relação a Rossana, sua paralisia se deveu a complicações durante o parto que a levaram a demorar 50 minutos para nascer. A princípio, Rossana tinha grandes dificuldades para falar e andar, como conseqüências de sua paralisia cerebral. Desde pequena, foi submetida a tratamento médicos e acompanhamento fisioterápico e fonoaudiológico. Hoje, porém, é capaz de exercer a profissão de professora como qualquer outra pessoa não portadora de deficiência, falando e andando sem problema algum.

A vocação de Rossana para estudar veio à tona quando sua fisioterapeuta pediu-lhe que ajudasse uma jovem de 17 anos, aproximadamente, também portadora de paralisia cerebral, que tinha dificuldade em realizar trabalhos no computador e outros exercícios. Rossana descobriu o quanto podia ser útil. A experiência mudou sua vida. E o apoio e a influência da mãe Glória, também educadora, foram fundamentais para que Rossana não desanimasse. Atualmente, ela só contabiliza conquistas. Está sempre atualizada quanto a congressos e seminários da área de Educação e, principalmente, sobre Educação Inclusiva. Recentemente, concluiu um curso de especialização em Matemática para o Ensino Fundamental, na Universidade Estadual do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). E mal vê a hora de aplicar tudo o que aprendeu, divulgando a inclusão mais ativamente.

Outro exemplo que comprova o sucesso da inclusão é o do jovem Duca Mendes, portador de deficiência mental. Quando nasceu, os médicos comunicaram à família dele que Duca nunca teria capacidade de falar nem andar. Hoje, com 25 anos, já escreveu dois livros, que foram divulgados pela Rhedes (Núcleo de Desenvolvimento Humano), e cursa a 6ª série do 1º grau. A sua deficiência mental um dia foi motivo de descrença em relação a sua potencialidade. Mas ele encara os obstáculos que surgem e busca meios de superá-los com otimismo. Aliás, foram as dificuldades que o levaram a escrever o livro.

O melhor caminho a seguir

A inclusão é benéfica para toda a equipe da escola envolvida no processo - professoras, diretoras e funcioná-rios. "A maioria desenvolve a solidariedade e a cooperação, tornando-se mais compreensiva, tolerante e confiante nas relações com o outro. Quanto a alunos ditos 'normais', quando participam da Educação Inclusiva, passam a ter uma vasta gama de modelos de papéis sociais, aprendizagem e redes sociais, aprendem a lidar com diferenças e passam a se oferecer, espontaneamente, para colaborar com os colegas, especialmente aqueles que apresentam deficiências" - diz a psicóloga clínica Neyse Amin.

"Já os estudantes com deficiências, quando inseridos na Educação dita regular, desenvolvem a apreciação pela diversidade entre indivíduos, adquirem experiências diretas relativas à variação natural das capacidades humanas e, tendo acesso a condições democráticas de ensino, demonstram crescente responsabilidade e aprendizagem acelerada" - completa a psicóloga. Rossana, Duca, entre outros jovens portadores de deficiência, são exemplos vivos de que a inclusão é possível. Resta, ainda, aos educadores, não oferecerem resistência a ela e poderem comprovar que é "condição sine qua non" para se educar de verdade.