Apenas uma história...

Rona Hanning

No curso de Literatura Infantil que dei hoje, o assunto foi Literatura de Imagem - um tipo de texto habitualmente esquecido pelos professores. A minha proposta foi a de, após a leitura de diversas imagens, discutir o que cada uma provocou, o que foi sentido com base nelas, quais as analogias surgidas.

A discussão ia muito bem, cada professor colocando a sua interpretação, falando sobre a sua leitura. Mas, enquanto lia Cântico dos Cânticos de Angela Lago, uma participante comentou: “Este é muito difícil, não consegui entender. Eu acrescentei que era preciso que se detivesse mais, que continuasse folheando o livro. Então, depois de algum tempo, ela disse: é como um labirinto, só entendi que existem duas pessoas - um homem e uma mulher - que buscam se encontrar e, quando se encontram, por um minuto, logo se separam.

Pergunto se esta pessoa, que há pouco havia dito que não tinha entendido nada, não realizou sua leitura diante daquelas imagens. Se, ao buscar compreendê-las, não interpretou o que via, dando um significado próprio ao texto. Niterói-RJ.

Como afirma Fayga Ostrower, “O ser humano é por natureza, um ser criativo. No ato de perceber, ele tenta interpretar e, nesse interpretar, já começa a criar. Não existe um momento de compreensão que não seja ao mesmo tempo criação.”

Parece-me necessário e urgente despertar a sensibilidade de cada sujeito, acordar essa capacidade criativa do humano, que anda adormecida e desacreditada. Fundamental, também, resgatá-la no professor, este grande co-responsável pelo exercício desta potencialidade. Afinal, a sala de aula é uma possibilidade de mudança quanto ao sombrio quadro de automatização e padronização a que estamos acostumados. Mudar no sentido de sermos capazes de acreditar em nossa potencialidade criadora e, conseqüentemente, podermos lutar por nossa manifestação de expressão mais pessoal.

Acredito que o trabalho com a Literatura, e também com a Literatura de Imagem, possa ser um caminho de mudança no sentido de despertar e fortalecer a sensibilidade, desde que, ao lidar com a arte literária, todos - professores e alunos - não a vejam como instrumento de ensino-aprendizagem, e sim como material provocador de curiosidade, encanto e prazer.

A Literatura então, deve nos provocar reflexão, em vez de nos responder questões. Na busca que fazemos, a começar por nossas leituras, é que poderemos encontrar as nossas respostas; nunca prontas; sempre à espera de serem descobertas. Esta é, também, a dimensão de sua magia!

OSTROWER, Fayga. A construção do olhar, In: O Olhar, Companhia das Letras, 7ªedição,1999.

Rona Hanning - Mestre em Educação na área de Literatura Infantil, pela PUC/RJ, e criadora do Espaço de Formação Docente, em

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