Como Identificá-lo?

Falta de atenção, dispersão, inquietação, atitudes impulsivas, desobediência as regras. Estas são características apresentadas por crianças que têm problemas disciplinares ou algum distúrbio de conduta, como o de déficit de atenção e hiperatividade. O problema é mais comum do que se imagina e faz parte do dia-a-dia de qualquer criança. A maioria dos professores, entretanto, não sabe como identificá-lo ou lidar com ele, o que agrava a situação. Afinal, se mal-administrados, os problemas disciplinares e, sobretudo, os distúrbios de conduta podem excluir a criança do ambiente escolar e social em que vive.

Segundo pesquisas realizadas por especialistas, cerca de 4% das crianças podem ter problemas deste tipo. Os meninos são os mais atingidos, em uma proporção de três meninos para uma menina. Diante deste quadro, preocupado com a quantidade de crianças que desenvolvem o problema e com a falta de esclarecimentos a cerca dele, o docente e pró-cientista da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Francisco de Paula Nunes Sobrinho, publicou, recentemente, o livro "Dos Problemas Disciplinares aos Distúrbios de Conduta: Práticas e Reflexões". A publicação reúne alguns textos de estudiosos sobre o assunto, discutindo e indicando como identificá-lo e tratá-lo.

São diversas as situações que podem desencadear os problemas disciplinares e os distúrbios de conduta na infância. Dentre elas, Francisco Nunes destaca as condições ambientais de pobreza; a superexposição da violência na mídia; os problemas de linguagem, de fala e de comunicação; as propostas pedagógicas mal planejadas; as maneiras equivocadas de interação professor-aluno; os padrões de relacionamento social entre pais e mães e os traços pessoais da própria criança. "E ainda observamos que estes fatores, quando desconsiderados, podem acarretar graves problemas na fase adulta, como o estresse e a depressão", esclarece Francisco, que obteve o título de PhD em Educação Especial pela Wanderbilt University, e concluiu o Mestrado em Educação na George Peabody College for Teachers.

Identificando os Problemas Disciplinares e os Distúrbios de Conduta

As principais queixas sobre indisciplina, muitas vezes associada aos distúrbios de conduta, incluem falta de atenção, dificuldades de concentração em uma tarefa, ou mesmo conclusão, para trabalhar individualmente, agressividade ou escassas habilidades pró-sociais, uma vez que o poder de concentração e a postura desafiadora da criança não se manisfestam. Mas Francisco Nunes alerta: "Deve-se tomar cuidado para não rotular a criança como problemática ou portadora de algum distúrbio". Segundo indicação do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - DSM-IV, da Associação Americana de Psiquiatria, é preciso observar se uma determinada atitude indesejável ao desenvolvimento da criança persiste por um período médio de seis meses. Só assim se poderá estabelecer um quadro de distúrbio de conduta. "Há crianças que perturbam até crianças perturbadas, ou seja, aquelas que cometem atos de indisciplina, mas não chegam a portar nenhum tipo de distúrbio", completa Francisco.

O caso mais comum de distúrbio de conduta observado em sala de aula é o déficit de atenção e aliado à hiperatividade (DDAH). De uma forma simplista, pode-se afirmar que o comportamento hiperativo se manisfesta através de quatro características básicas: excesso de atividade psicomotora, certo grau de desatenção, impulsividade acima da média e difilculdades em lidar com as frustrações. As crianças hiperativas são extremamente agitadas, pois sua atividade motora é excessiva, dificilmente conseguem finalizar uma tarefa e, freqüentemente, tomam atitudes sem reflexão, como xingar, chutar ou dar respostas malcriadas aos amigos de turma e professores. "Mas é preciso tomar cuidado para não interpretar qualquer atitude malcriação da criança como déficit de atenção e hiperatividade", explica Francisco Nunes.

O principal sinalizador do problema é o baixo rendimento escolar. Estudos feitos, em 1992, na cidade de Fowler, mostraram que 30% das crianças e dos adolescentes alunos de escolas do Ensino Fundamental e portadores de déficit de atenção, são reprovados, pelo menos uma vez, ao longo dos anos escolares; 46% são suspensos da escola mais de uma vez; 11% são expulsos e 10% abandonam a escola antes de terminarem o curso. Sabe-se, ainda, que este distúrbio ocorre, muitas vezes, associado a problemas de memória, de linguagem receptiva e expressiva e de habilidades executivas, como o manejo ineficiente do tempo e a desorganização do material escolar. E, quando associado a hiperatividade, o distúrbios de déficit de atenção pode causar problema grafomotor mais grave. Este pode ser identificado, mais facilmente, nos primeiros anos de instrução, na escola primária ou mesmo na pré-escola.

Problemas disciplinares ou distúrbios de conduta são, também, apresentados pelos superdotados. A criança superdotado, por adquirir e reter informações rapidamente, é impaciente diante da lentidão dos colegas e fica entediada com a escola e os colegas. Como tem vasta curiosidade intelectual e atitude inquisitiva, é bastante crítica também, embora igualmente criativa. E costuma fazer perguntas que incomodam o professor, rejeitando o que é tido como verdade, o que pode levá-la tornar-se desencorajada ou deprimida, diante da impaciência do professor.

Os problemas de superdotação, déficit de atenção e hiperatividade e outros distúrbios de conduta não são, no entanto, "bichos-de-sete-cabeças". Para identificar casos como estes e saber lidar com eles, basta conhecer o assunto, a criança e o mundo que a cerca. Sem negar a importância de fatores de ordem social, econômica e cultural, a solução para os problemas de disciplina ou de distúrbios de conduta está intimamente ligada a atividades educacionais bem planejadas. "Extremismos não levam ninguém a parte alguma. Infelizmente que mais vemos são escolas punitivas que, em vez de incluírem em projetos didáticos e pedagógicos bem-definidos atividades que prendam a atenção do aluno, preferem expulsá-lo de sala de aula, após qualquer ato de indisciplina", lamenta Francisco.

Informação Pode Ser a Solução

Informar-se e trocar experiências são essenciais a todos que estão envolvidos, direta ou indiretamente, com a Educação. No entanto, as questões disciplinares raramente são pesquisadas, analisadas, discutidas. Conforme pesquisa realizada, em 1996, pelos especialistas Jack, Shores, Denny, Gunter, De Briere e De Paepeapenas, 5% dos professores capacitação para lidar com as diferenças em classe, e os que demonstravam esta competência técnica, haviam aprendido com colegas de classe. "Os problemas disciplinares surgem, muitas vezes, devido a dificuldades em se formular um planejamento didático direcionado para a turma. O professor não sabe como enfrentar problemas de comportamento na sala de aula", confirma Francisco Nunes.

Diante deste quadro, com o objetivo de orientar o professor em relação aos problemas de disciplina e distúrbios de conduta, o docente Franscisco Nunes vem desenvolvendo um projeto de pesquisa "Autocontrole como Possibilidade de Solução de Problemas Disciplinares na Escola", com o apoio do CNPq, em uma escola pública do Rio de Janeiro. O projeto tem por fim desenvolver habilidades pró-sociais em crianças indisciplinadas no ambiente escolar. "Primeiro, ouço as dificuldades e queixas dos professores. Em seguida, com base em conhecimentos científicos, indico a solução ou os procedimentos adequados ao problema", explica Francisco.

A grande preocupação do docente e pró-cientista em relação ao projeto é apontar a eficácia dos procedimentos de autocontrole da criança no ambiente escolar. Segundo Francisco, além dos pais, os professores são importantes mediadores na relação com crianças que necessitam aprender a controlar o comportamento e impulsos, planejar e executar ações. Ele explica, em seu livro, que qualquer criança, desde que não apresente comprometimentos significativos de desenvolvimento, pode ser ensinada a gerenciar e modificar seus próprios comportamentos.

Francisco de Paula Nunes Sobrinho UERJ - Faculdade de Educação Tel. (oxx21) 587-7457 / 587-7535 E-mail: fnunes@uerj.br

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