REVISTA APPAI EDUCAR - EDIÇÃO 137
Revista Appai Educar 5 Aplicações dos estudos neurocientíficos à prática escolar Opinião Os conceitos e opiniões emitidos em artigos assinados são de inteira responsabilidade dos autores. Jorge Henrique Oliveira* Pela nossa pesquisa pudemos observar que o que grande parte chama de dificuldade de aprendizagemdeveria ser re- visto como ummodelo de ressignificação da própria escola, uma vez que os organismos ali inseridos estão diante de con- textos bemdiversos, cada qual devendo receber os estímulos de acordo com sua predominância ou propensão. Nosso cérebro é biologicamente determinado a nos fazer sobreviver. Quando os pais inserem seus filhos na escola, semque reconheçamque há uma função nobre a ser valo- rizada nesse ambiente, apenas se cumpre a determinação legal demantê-los matriculados e frequentando. Mas, do ponto de vista deste organismo (doravante chamado aluno), a escola é apenas um local emque ele está contra sua vonta- de, violando assim sua necessidade básica de correr, dormir, excretar etc. Nessa situação, seu cérebro reptiliano aciona os mecanismos de defesa, e o resultado é que quadros como a irascividade, a ansiedade, omedo acabam semanifestando no espaço escolar. Paralelae simultaneamentea isso, osistema límbico, sua partemamífera, vai procurar os escapes, atravésda indisciplina, brigaspor espaçooupor qualquermotivo, enquantoaatenção necessáriaparaamemóriaeestruturas superioresdoneocórtex superior ficaemsegundoplano, fazendoocérebrodeste indi- víduoentrar emestruturasdebloqueio. Umadas experiências maispositivasquepudemos ver ocorreemescolasque trabalha- vamosistemade recompensa, ondeeramagraciadosos alunos quevoluntariamentemelhoravamseus rendimentos acadêmi- cos e seus relacionamentos comoutros estudantes. Nesta relação tensa, esbarramos na formação docente que, despreparada para lidar comuma classe que está diante dele contra a vontade, já o vê como umadversário a ser com- batido, enquanto os modelos tradicionais de ensino reforçam que o professor deve ser um “conquistador”, ideia que, na verdade, já caiu emcolapso na prática, pois apenas nas sé- ries iniciais, cuja família ainda respeita a figura docente, esta autoridade é considerada. Esse papel reforça que o educador entrou no jogo de disputa de sobrevivência do cérebro da- quela categoria de alunos. O que defendemos aqui é que apoios metodológicos mais adequados favorecem recortes que desarmemo siste- ma reptiliano, mostrando ao aluno que a escola é sua única fonte de sobrevivência, não uma forma de castigo. A aborda- gempassa pela reformulação da estrutura de atendimento ao estudante e da direção escolar. Uma ação voltadamais para o contato, as trocas de olhares, a comunicação não-ver- bal emque haja uma humanização do ambiente, diálogos e rediscussão do papel da autoridade. Mas esta pesquisa tambémvisualizou quemuitos do- centes em sua prática demonstraram interesse emuma nova abordagemagregando à sua aula ummodelo de acolhimen- to que desarma a estrutura de autodefesa. Porémnão con- seguemmanter por muito tempo essas conquistas, uma vez que os anos da educação básica englobamumperíodo de 12 anos, de forma que uma prática diferente faz pouco impacto no sistema de ensino. Defendemos que, ao compreender que o cérebro temestruturas que vão alémda cognição, a prática epistemológica deve abordar tambémaspectos não cogniti- vos em suas ações para alcançar sucesso. Com todo o cabedal de conhecimento da neuroplas- ticidade do cérebro, podemos vislumbrar que talvez seja possível o desenvolvimento de ummétodo que atenda aos estudantes com limitações de aprendizagem, pois, como estamos aqui tentando demonstrar, as dificuldades nesse aspecto residemna relação entre o sistema de educação e o cérebro do aluno. Como cremos que é possível ensinar a todos, e o cérebro comas estruturas corretas pode, com meios facilitadores, abrir novas conexões, é possível viabilizar tanto o desenvolvimento cognitivo-comportamental, como a socialização e as estruturas superiores. É sabido que, emambientes de perigo, as estruturas pri- mitivas do nosso cérebro entramemação fazendo comque o sistema límbico atue de forma a nos posicionar emcondições de defesa. Esse sistema ocorre emparalelo como cognitivo que, com sua capacidade de julgamento preservada, pouco pode fazer se todo o sistema não iniciar manobras de reequi- líbrio, como a respiração profunda oumesmo amudança de foco, técnicas essas que podem ser aplicadas como devido treinamento ao professor, se este tambémestiver de posse consciente do domínio de suas funções cerebrais. *Jorge Henrique Oliveira é Mestrando em Ciências da Educação pela Universidad Columbya, Bacharel em Filosofia pela UFRJ e Professor pelo Iserj atuando na rede municipal de Nova Iguaçu.
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