Revista Appai Educar - Edição 123
Opinião 4 Que projeções ficaram refletidas em nosso trabalho? Pela amostragem, como um todo, uma pequena parcela dos entrevistados – em torno de 1% – estaria próximo de um docente ideal. No percentual restante, a imagem de um intelectual orgânico desliza nitidamente para a imagem do gestor – aquele profissional preocupado, sobretudo, em transmitir, dentro de uma determinada estrutura curricular, os conteúdos programáticos. Esse “professor-gestor” não se atém em colocar em causa a eficácia desse tipo de prática pedagógica. Tal posição ficou bastante refletida quando os entrevistados apontam que ser professor do ensino básico é diferente de atuar no ensino superior, porque o aluno universitário tem autonomia para aprender sozinho. Uma outra implicação decorrente dessas visões é a cisão que se estabelece entre o teoricismo acadêmico e o enfrentamento de um cotidiano escolar. Oitenta por cento dos entrevistados respondem que a universidade não oferece capacitação suficiente para a atuação como professor. São docentes que ratificam que o “processo de capacitação” é importante, mas não sabem explicitar onde reside, exatamente, essa “importância”. Estamos diante também da universidade que não queremos, no sentido de que os professores não se sentem bem preparados. A resposta às questões sobre a oferta da universidade ser suficiente para a prática na sala de aula e a importância da busca por novos meios de capacitação alcançou percentuais bastante significativos: noventa por cento responderam que no curso superior não tiveram formação suficiente para enfrentar a sala de aula e noventa por cento afirmaram a necessidade de capacitação continuada. São percentuais que reafirmam, por um lado, a universidade deficitária que nos é oferecida e, por outro, por ser esta universidade com deficiências, a necessidade de um aprimoramento constante. Outro impasse. Todos confirmam a formação continuada como necessária, entretanto, ao mesmo tempo, colocam em pauta o fato de as condições de trabalho, quase nunca, favorecerem a busca por uma constante especialização. Faltam recursos para participarem de congressos e seminários; falta entrosamento em grupo de trabalho para enveredarem em pesquisas. Tudo que a universidade não vem oferecendo. Enfim, em termos gerais, constatamos haver neste nosso percurso uma grande distância entre os parâmetros calcados em renomados teóricos da educação e as projeções espelhadas nas repostas daqueles que atuam na docência superior. Não trabalhamos com um grupo numeroso – foram apenas 11 os entrevistados. Mas o que dizer do fato de termos abordado mais de 30 profissionais e apenas menos da metade se dispuseram a nos responder? O não-dizer está presente, porém, nas duas posturas, tanto nas respostas silentes daqueles que não devolveram as perguntas, quanto nas respostas evasivas, lacônicas. Onde se esconde a face do intelectual orgânico? * Elizabete da Silva Machado é professora aposentada da rede privada e do município do Rio de Janeiro, pós-graduada em Ciências Ambien- tais e mestre em Ciência da Educação.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy MTA5NTc=