BNCC e a imprensa mirim

Saiba como o texto jornalístico pode contribuir para o aprendizado e a formação dos alunos


Muito se discute a utilização dos jornais como complemento de projetos pedagógicos em sala de aula. Quem viveu a escola até meados da primeira década dos anos 2000, certamente lembra das atividades em que se fazia recortes e colagens dos periódicos, que também servia como fonte de pesquisa em det erminados casos, como a produção de textos. Hoje em dia quase não se usa de forma física, mas a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) desafia sua utilização até hoje (vamos ver isso mais à frente).

Os jornais também funcionaram como fontes de inspiração de muitas turmas que resolveram produzir seus próprios periódicos em sala de aula. O intuito era diverso e completamente versátil em relação à aplicabilidade nas disciplinas. Com essa matéria, você vai se inspirar na hora de criar seu material de língua portuguesa cumprindo as normas da BNCC.

Para começar, é primordial folhear, apreciar, ler e entender a estrutura dos jornais. Afinal, quais são os objetivos deles? São inúmeros em circulação pública e cada um tem sua particularidade, seja no conteúdo, na linguagem ou nas imagens. Para essa atividade, vamos seguir a habilidade sugerida pela BNCC, pois em seu documento normativo do Ministério da Educação (MEC) ela aborda elementos do jornalismo em vários aspectos, sugerindo que os professores de língua portuguesa podem desenvolver em suas propostas pedagógicas gêneros textuais, entre eles: poemas, crônicas, notícias, reportagens e textos científicos.

Trata-se, em relação a este campo, de ampliar e qualificar a participação das crianças, adolescentes e jovens nas práticas relativas ao trato com a informação e opinião, que estão no centro da esfera jornalística/midiática. Para além de construir conhecimentos e desenvolver habilidades envolvidas na escuta, leitura e produção de textos que circulam no campo, o que se pretende é propiciar experiências que permitam desenvolver nos adolescentes e jovens a sensibilidade para que se interessem pelos fatos que acontecem na sua comunidade, na sua cidade e no mundo e afetam as vidas das pessoas, incorporem em suas vidas a prática de escuta, leitura e produção de textos pertencentes a gêneros da esfera jornalística em diferentes fontes, veículos e mídias, e desenvolvam autonomia e pensamento crítico para se situar em relação a interesses e posicionamentos diversos e possam produzir textos noticiosos e opinativos e participar de discussões e debates de forma ética e respeitosa

Sobre o Campo Jornalístico Midiático (BNCC, p. 140)

 

Na prática, a Base traz algumas habilidades a serem desenvolvidas nas linguagens, como produzir resenhas críticas, mas também desperta atenção em novas ondas de acontecimentos, como as fake news. Por isso, um dos tópicos sugere analisar o fenômeno da disseminação de notícias falsas nas redes sociais e desenvolver estratégias para reconhecê-las, a partir da verificação/avaliação do veículo, fonte, data e local da publicação, autoria, URL, a análise da formatação, a comparação de diferentes fontes, a consulta a sites de curadoria que atestem a fidedignidade do relato dos fatos e denunciem boatos, entre outros.

Assim, explorar esse campo possibilita uma qualificação que está pautada na formação do pensamento crítico, na seleção confiável de fontes, na análise de produção e circulação de informações, no olhar crítico sobre o consumo, na atuação não somente como consumidores, mas também produtores de informações, além de dados que estão pautados pelos princípios da ética e cidadania consciente.

Além do mais, o aluno que se desenvolve lendo jornal absorve o senso crítico, que o leva a questionar a veracidade e a natureza das fontes de informação de conteúdos jornalísticos e outros de origens diversas. O objetivo dessa ementa da BNCC é tornar os estudantes conscientes da atuação dos veículos de comunicação. A prática constante de leitura de jornais e a busca contínua por informações podem motivar uma atitude engajada e interessada pelo que acontece além dos muros de uma instituição educacional.

 

Dica de ouro: os alunos adoram praticar

A professora de português da 5ª série Marilice Fernandes Heidemann, da Escola Municipal de Ensino Fundamental Albano Kanzler, de Jaraguá do Sul (SC), teve uma grata surpresa. Diante desse desafio da BNCC, sua preocupação era desenvolver esses conteúdos de forma interessante, sabendo que os estudantes apresentavam muita resistência para ler e escrever. Então, um recurso apareceu como um presente. A mãe de uma aluna enviou para a turma exemplares de jornais, que acabaram se tornando o pote de ouro para a aprendizagem, pois ao analisá-los percebeu-se o quanto eles transbordavam gêneros textuais e o quanto poderiam ser valiosos. A partir desse pontapé inicial, a professora buscou desenvolver os diversos tópicos com a turma.

“Elenquei os conteúdos da BNCC que deveriam ser trabalhados e outros que constantemente devíamos recapitular, na perspectiva linguística, e conversei com os alunos sobre o que eles conheciam desses gêneros. Com base nos conhecimentos prévios, pedi a eles que escrevessem seus primeiros textos de forma coletiva. Procurei incentivá-los, organizando as falas e coordenando o grupo. Os alunos compararam os textos e, em seguida, reescreveram os conteúdos individualmente, revisando-os e os aprimorando, para fins de publicação”, explicou Marilice.

Após dividir os alunos, ela promoveu pesquisas sobre os gêneros textuais notícia, reportagens, crônicas e os levou ao Núcleo de Tecnologia Municipal (NTM), onde fizeram leituras dos textos de alguns autores, analisando a parte gramatical, como o escritor constrói cada parágrafo, qual enfoque dado e as características específicas de cada estilo. “Li os gêneros textuais, tentando passar o máximo de emoção possível, pois acredito que leitura e escrita vêm do coração, da vivência e da emoção”, relatou a professora.

“Iniciei, com o apoio do livro didático, o trabalho com notícias e sobre sua formação para a escrita. Recortamos algumas para leitura. Debatemos, interpretamos e comparamos com a aprendizagem do livro. Os alunos pintaram partes de uma notícia: manchete, olho, lead e desenvolvimento, reconhecendo como estava escrita cada parte, para, depois, reescrevê-la com sua interpretação. Após, fizeram um mural com os textos trabalhados”, disse a coordenadora do projeto.

Outro ponto interessante da atividade foi quando a professora propôs olhar os jornais da cidade e do estado para analisar sua organização (cadernos de esporte, economia, política etc.). Os alunos também avaliaram alguns produtos voltados ao público infantil, a fim de perceber sua importância para a aprendizagem, sua estética e seus temas.

Os estudantes também escreveram notícias de fatos narrados por jornais da TV e as apresentaram para a turma, num noticiário imaginário, confeccionado com caixas pelos próprios alunos.

Sob outra perspectiva do livro didático, uma nova missão foi posta: produzir uma crônica, gênero textual narrativo que tem por base fatos do cotidiano, com uma visão própria do escritor. Os alunos procuraram reconhecer, numa crônica, a visão do autor, seu comentário e sua interpretação de algo acontecido no dia a dia. Para dar suporte, Marilice realizou leituras semanais desse gênero publicadas em jornais e livros.

Para aguçar ainda mais a curiosidade dos alunos, a professora também programou uma visita técnica na sede do Jornal do Vale do Itapocu, para que a turma conhecesse a redação e fosse incentivada a dar continuidade ao trabalho. Os estudantes entrevistaram a dona do jornal, editores, repórteres e fotógrafos, perguntando sobre todas as etapas que envolvem a produção de um periódico até chegar às mãos dos leitores. Logo nasceram outro desafio e uma parceria irrecusável. Os alunos foram convidados a produzir um “suplemento” infantil, batizado, de forma original pela turma, de “Eduk Kids”.

Diante dessa oportunidade, a primeira definição para iniciar a produção do conteúdo foi uma pesquisa de público alvo. “Fizemos uma única pergunta aos colegas do 3º e 4º ano: ‘O que você gostaria de ler e ver num suplemento de jornal para criança e adolescente?’. Com isso, a turma percebeu também a importância da participação coletiva e do compartilhamento do ensino e da aprendizagem com outros colegas. Os alunos das outras classes adoraram participar, sentindo-se importantes por darem suas opiniões”, refletiu a professora.

Após uma intensa aprendizagem, os gêneros textuais foram distribuídos entre duplas e realizaram uma exposição para análise dos grupos, buscando o melhor a ser incluído no suplemento final. Críticas, notícias, dicas de livros, games, moda, animais e até ilustrações foram produzidos. “Com nossa joia pronta, levei ao jornal parceiro. Uma semana depois, recebemos o ‘boneco’ do suplemento para análise e leituras de correção. Corrigido e pronto, o ‘Eduk Kids’ foi enviado para a redação e, por fim, para a diagramação e impressão”, relembrou Marilice.

Uma semana depois, a escola recebeu o jornal impresso. O suplemento mereceu chamada na capa. Gritos, palmas, parabéns e muita emoção com o resultado. “Nosso trabalho estava pronto e em forma de jornal! Era o esforço de um grupo, do 5º ano, mas com a participação de colegas, professores e alunos das outras classes. Processo de ensino e aprendizagem gerando emoção e garantindo conhecimento”, enalteceu. A turma foi de sala em sala para entregar o periódico para cada aluno, mas o trabalho não parou. Eles ainda fizeram um cartão de agradecimento para o jornal parceiro, torcendo para que o projeto tomasse corpo em outras escolas, para divulgação dos seus trabalhos.

De acordo com a professora, para executar o projeto buscou-se a Proposta Curricular, fonte interna da escola em que estão determinados os conteúdos de trabalho para cada ano. Também foram estudados os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental e as diretrizes da parte linguística, gramatical e ortográfica dos gêneros textuais que seriam trabalhados. Foram utilizados ainda livros sobre didática, avaliação e estratégias de ensino.

 

Para agregar ainda mais sua atividade

Para completar as sugestões, explique aos alunos quais são as etapas do jornalismo e os cuidados seguidos para produzir uma notícia. Oriente-os para que prestem atenção aos termos:

PAUTA: Relação de assuntos ou temas que nortearão o trabalho jornalístico. Em geral, a pauta é definida em uma reunião a partir da qual o jornalista começará a executar sua atividade de apuração e checagem. Pode surgir a partir de um fato, de uma pista passada por alguém ou mesmo da curiosidade do repórter.

FONTE: Portadores de informação consultados pelos jornalistas para elaborar reportagens. Podem ser autoridades, especialistas ou mesmo documentos, dados e gráficos. As fontes transmitem as informações aos repórteres e, no caso de pessoas, podem ou não ser identificadas (quando a identidade da fonte é preservada, para evitar retaliações, por exemplo, chamamos de fonte “em off”).

CHECAGEM: Processo de verificação das informações, para garantir que sejam confiáveis. O próprio jornalista que está escrevendo uma reportagem precisa procurar diversas fontes para confirmar uma mesma informação. Além disso, existe no jornalismo a figura do editor, que vai ler, ouvir e ver tudo o que foi produzido pelo repórter e também questionar a veracidade das informações antes de divulgá-las ao público.

Assista o vídeo Conhecer para Defender

Vale ressaltar que este material focou na produção de jornais, mas o campo permite explorar a divulgação científica, a comunicação oral, a produção de publicidade fictícia etc., o que abre caminho para outros formatos e domínios que a criatividade permitir.


Por Richard Günter
Fontes: BNCC | MEC | Educamídia | Instituto Palavra Aberta


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