Carlos Santana (*)

A implementação da Lei 10.639 – que inclui a História e a Cultura Afro-brasileira e Africana no currículo escolar – foi uma das primeiras leis a ser sancionada pelo governo Lula, em janeiro de 2003. Porém, já se passaram quatro anos e, no entanto, a avaliação é de que, apesar dos avanços, ainda é necessário mais empenho para superar as barreiras de “500 anos de história equivocada”.

Essa lei deveria alterar as diretrizes e bases da educação, porém, muitas escolas ainda não tomaram conhecimento da Lei n.º 10.639, de 09 de janeiro de 2003, deixando, com isso, de dar o devido reconhecimento àqueles que deram o sangue pelo progresso desse país e deixando também de lhe conferir a face que ele apresenta hoje, pela diversidade cultural e pelas riquezas descobertas.

Por isso, é necessário que haja, nos currículos, o ensino da cultura afro-brasileira. Contudo, não basta ditar novas regras para o jogo, é preciso fazer com que as medidas saiam do papel e se efetivem, de fato, nas escolas. Já se sabe que existe um farto material sobre o tema e também que este é do conhecimento de boa parte dos professores e funcionários, como bibliotecários, por exemplo. Todavia, ainda não há impacto sobre os alunos.

A formação do educador não deve apenas contemplar a questão dos conteúdos, mas, sobretudo, discutir o racismo na escola, os conceitos de discriminação, além de abordar valores. A maioria dos professores, entretanto, não tem acesso a um conteúdo aprofundado sobre a África nas escolas e faculdades – fato que dificulta a aplicação do tema, tanto que, até pouco tempo, nós estudávamos o Egito como se fosse fora da África.

Vamos trabalhar para uma formação de quali­dade em todos os níveis que traga a percepção da África enquanto berço civilizatório da humanidade. Não podemos só falar do continente por suas cores vibrantes, sua música, culinária etc. Isso, aqui no Brasil, já vem sendo feito há 500 anos. Temos de perguntar para nossas crianças o que elas querem saber sobre a África, sua cultura, seus rituais e sua arte... enfim, sobre a sua história.

Quando a lei foi sancionada, surgiu uma oportunidade única para se falar abertamente de preconceitos e conflitos raciais. Sabemos que estão sendo feitas diversas pesquisas e também que o governo vem investindo para que a lei seja aplicada. Porém, ainda é preciso fazer muito mais. Podemos observar que, apesar de a lei ter entrado em vigor em 2003, alguns livros didáticos ainda tratam a história de forma equivocada, a partir do ponto de vista do colonizador como, por exemplo, na abordagem da Abolição da Escravatura e do aniversário da morte de Zumbi dos Palmares, transformados em Dia da Consciência Negra.

Não devemos esquecer, no entanto, de mencionar que coisas bacanas vêm acontecendo, como a publicação de livros e da diretriz nacional da lei, que está sendo distribuída gratui­tamente. Porém, o mais triste, no Brasil, é constatar que tivemos de criar uma lei para que as crianças pudessem ter acesso à sua própria história e que os estereótipos sobre a África só vão sumir quando houver conhecimento sobre o continente e suas influências, uma vez que só o conhecimento faz com que educadores, jovens e crianças percebam que sua identidade existe para além do processo de escravidão. Esses outros olhares sobre a cultura africana precisam ser despertados para, a partir daí, gerar uma mudança de auto-estima importante.


Carlos Santana é Deputado Federal pelo PT-RJ e Presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Igualdade Racial.
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