E quem disse que não dá?

Escola transforma ambiente urbano em área integrada com o verde


Transformar cimento em espaço verde a princípio pode parecer algo utópico. Mas não para a comunidade escolar da Municipal Francisco Cabrita, localizada na Tijuca, Zona Norte do Rio, que criou o projeto O verde na escola – uma proposta pedagógica para a construção de ações sustentáveis, sob a coordenação da professora Jenny Iglesias Polydoro Fernandez, doutoranda em Teoria da Literatura e Literatura Comparada pela Uerj e regente da sala de leitura das municipais Francisco Cabrita e Camilo Castelo Branco.

 

Hoje uma muda, amanhã uma história sustentável!

Comprometida com os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), Jenny conta que, com o apoio da comunidade escolar, começou a implementar pequenas ações, entre os alunos do 2º segmento do Ensino Fundamental, a partir desse olhar consonante às metas que preveem cidades e comunidades sustentáveis. Uma delas tinha a ver diretamente com a área construída da escola que era totalmente cimentada.

Fora essa inquietação, tantas outras ajudou a gerar na professora a atitude de transformar, afirma Jenny relembrando que, “somado ao fato de estarmos expostos a temperaturas bem elevadas, a unidade escolar carecia de um espaço verde”. Além da promoção de uma melhoria sustentável no espaço físico e no dia a dia dos usuários, outras áreas precisavam re-aprender a ter uma gestão consciente e sustentável de seus recursos, como água, energia elétrica, mobiliário escolar, material didático e alimentos da merenda, favorecendo o desenvolvimento de atitudes positivas em relação à escola, às famílias e à sociedade em geral.

 

Saindo da horizontalidade

Mas como todo projeto, depois de idealizado, o passo seguinte foi dar início junto à comunidade escolar. Um dos desafios a serem vencidos, recorda a regente da sala de leitura, foi trabalhar com muitas paredes sem área de cultivo em solo e poucos recursos. “Então a alternativa encontrada foi a instalação de um jardim/horta vertical com plantas ornamentais, ervas medicinais e de temperos, em uma das paredes do pátio”, explica Jenny, fazendo questão de destacar as primeiras mudas trazidas pelos alunos, como a babosa, o boldo, suculentas e cactos, além de folhagens ornamentais.

Por ser tratar de uma ação coletiva, desde o início ficou clara a importância da participação de toda a comunidade escolar, alunos, professores, pais e funcionários, como agentes de transformação na construção do jardim e horta verticais na E. M. Francisco Cabrita. Participação garantida, agora era a vez de angariar os materiais necessários para o empreendimento, como pallets, tintas e pneus de caminhonete, todos doados por novos e antigos parceiros da escola. Dessa maneira, o ano letivo de 2018 seguiu com o plantio das primeiras mudas doadas pela comunidade escolar.

 

Reciclando esperança

A professora explica que cada material já tinha um destino certo, uma vez que um dos pilares educativos da escola está no reaproveitamento de materiais, a fim de dar-lhes um novo significado, garante Iglesias, acrescentando que é proposta pedagógica da Municipal Francisco Cabrita pensar o conceito de sustentabilidade como tema transversal e interdisciplinar, presente nas atividades curriculares.

A criação artística também ganhou espaços entre os alunos ao transformarem pneus usados, cedidos por parceiros, em abrigo estilizado para as palmeiras Rabo de Peixe e Açaí (veja as fotos, doadas pelo Horto do Jardim Botânico do Rio de Janeiro). Dessa maneira, em meio a mudas e mudanças, a doutoranda relata que, o que era a princípio um pequeno viveiro adaptado com mudas doadas, transformou-se no projeto O verde na escola – uma proposta pedagógica para a construção de ações sustentáveis. Abrindo espaço também para discussão sobre o conceito de sustentabilidade e afeto, eixo principal para nortear o Projeto Político-Pedagógico de 2018 e também a Feira Cultural da escola intitulada “Aquele Abraço”!

 

Feira cultural em muitos abraços

Nesse mesmo ano de 2018, surgiu, entre os professores, a iniciativa de uma abordagem mais aprofundada em relação à sustentabilidade. “O tema da nossa feira cultural daquele ano tinha como um dos eixos o meio ambiente em que vivemos. Assim, o primeiro passo foi a promoção de conversas e reuniões no ambiente escolar, organizadas pela coordenação pedagógica e sala de leitura”, lembra a professora regente, acrescentando que, depois, este debate se estendeu para as salas de aula e começou a fazer parte do planejamento dos professores, principalmente de Ciências, Geografia, História, Português e Literatura, promovendo um diálogo entre as áreas do conhecimento.

Para a culminância do evento cultural, muitos materiais foram reciclados e reaproveitados para dar lugar a instalações e objetos decorativos, oferecendo a eles um novo significado. Desdobramentos do que era discutido em sala de aula foram o mote para exposições, debates e apresentações nos mais variados espaços da escola, culminando na fixação de pallets para a criação do jardim vertical.

 

Um regador interdisciplinar

Com a amplitude e aderência do projeto, professores de outras disciplinas também se uniram ao processo, transformando-o em uma atividade interdisciplinar com aulas expositivas e teóricas. A professoras de Ciências Flávia Vargens e Maruzza Murray trabalharam seus conteúdos a partir do Projeto Verde, enfatizando eixos temáticos, como, por exemplo, Terra e Ambiente; Vida e Ambiente; O reino vegetal e sua diversidade, bem como classificação e fotossíntese.

“Esse trabalho, especificamente o do plantio, tem muito a ver com o que a gente estuda no sexto ano em Ciências, sobre o meio ambiente, o solo, a água, como é o planeta, como são as relações entre os seres vivos etc. É mostrar para os alunos que podemos cuidar do espaço natural em que vivemos, mesmo ele sendo completamente modificado pelo ser humano”, enfatiza a professora Flávia Vargens.

Já a professora Michele Miranda, de Geografia, trouxe para a sala de aula, a partir daquela vivência e aproximação das variadas espécies de mudas, conceitos geográficos de território, paisagem, relevo, globalização, urbanização, energia elétrica, problemas ambientais, clima e outras teorias demográficas. Jenny revela que, além dos professores de Ciências e Geografia, os alunos do 6ºano ficaram responsáveis pelas primeiras ações da montagem do jardim/horta vertical, que contou com o apoio de funcionários e da equipe gestora.

 

O verde invadiu a escola

Em pouco tempo, a aridez da escola foi substituída pelo verde que passou a compor, harmoniosamente, os mais diferentes espaços, desde o beiral e grades de janelas, passando pelo pátio interno até a sala dos professores. “O corredor de acesso à escola ganhou muitos vasos de plantas ornamentais que tinham a rega garantida por causa do reaproveitamento da água dos aparelhos de ar-condicionado da escola municipal vizinha, Mário da Veiga Cabral”, sinaliza a professora.

Jardim Vertical e a floresta de grafite

A transformação estética do ambiente escolar contagiou responsáveis e visitantes que frequentavam a escola, alunos e professores, funcionários e também a equipe gestora, que propôs a inserção do grafite, através do professor Heriton Bacury, diretor adjunto, como expressão artística e plural nas práticas pedagógicas. Em oposição às pichações, que poluem os muros dos bairros cariocas, a escola incentivou essa típica arte de rua e, com muito spray e criatividade, as paredes abrigaram também as intervenções urbanas. “Inserir o grafite como forma de manifestação artística, beleza e arte nos espaços da escola é também um caminho possível para abrir um diálogo mais próximo com os alunos e alunas que se identificam com esta linguagem”, garante a professora Jenny.

Primeira Orquídea do Jardim Vertical (setembro/2021)

Todo esse resultado positivo foi sentido também pelos pais dos alunos. “Eu acho que, quando você coloca essas coisas [plantas] na escola, as crianças conseguem enxergar que têm que cuidar, que podem fazer isso, podem plantar também, podem ter em casa!”, frisou Vanessa Sampaio, mãe da aluna Geovanna, da turma 1.901.

 

Os resultados sempre valem o esforço!

Ao ser questionada sobre como foi vivenciar uma atividade que rompeu os muros escolares e abrigou-se também nas casas dos pais dos alunos, Jenny exalta o comprometimento de todos desde o início do projeto até o momento atual. “É muito gratificante ver o espaço preservado e cuidado por todos. Não se vê lixo nos pneus ou depredação nos vasos, e sim alunos tirando selfies para postar nas redes sociais. Aliás, faço votos que esta reportagem viralize e inspire outras escolas. A replicabilidade deste projeto em outras unidades escolares é bem significativa, pois o custo é baixo e a manutenção pode ser feita por todos os membros da comunidade, enfatizando o protagonismo juvenil,” pontua.

Ao falar sobre a contribuição do projeto além dos muros escolares, a professora diz ter a certeza de que a realização desta atividade cooperou não só para a transformação do espaço escolar, mas também na forma de pensar o nosso lugar no mundo. “Como tudo aquilo que realizamos não fazemos sem parceria, também há de se registrar o empenho de muitos profissionais em manter o jardim/horta vertical mesmo num cenário pandêmico. Nossas plantas recebem os cuidados irrestritos da funcionária residente Rejane Santos que, durante períodos de recesso ou férias escolares, se coloca à disposição para regá-las e cuidar do espaço”, completa lembrando que atualmente o jardim vertical mantém muitas espécies plantadas inicialmente e, aos poucos, as flores invadem a paisagem.


Por Antônia Lúcia
E. M. Francisco Cabrita
Rua Melo Matos, 34 – fundos – Tijuca
Rio de Janeiro/RJ
CEP: 20270-290
Tel.: (21) 2204-0185
E-mail: emcabrita@rioeduca.net
Professora idealizadora: Jenny Iglesias Polydoro Fernandez


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