Dando nome a nossas intervenções na língua


 

É muito interessante reparar como os seres humanos inventam maneiras cada vez mais criativas de empregar os idiomas. No caso da língua portuguesa várias dessas inovações já foram batizadas. Vamos conhecer algumas delas? A primeira que vamos abordar é o Neologismo, que resulta da necessidade de dar um nome a coisas que passam a existir num determinado contexto. Exemplos:

Pessoas que causam são reconhecidas.

Uma capacidade animal de criar.

Nas duas frases acima, as palavras destacadas, apesar de já pertencerem ao vocabulário da língua, estão empregadas com um sentido totalmente novo, diferente do tradicional.

– Uma outra fonte interessante de neologismos é a genialidade de mestres da palavra. Acompanhe:

…ele, no oco sem beiras, debaixo do peso, sem queixa, exemploso.

…a gente só escutava era o acorçôo do canto, das duas, aquela chirimia, que avocava.

Os termos em destaque nos dois trechos destacados revelam o gênio de Guimarães Rosa, utilizando a lógica de formação de palavras da língua portuguesa para criar novos vocábulos. O autor aproveita um radical (exempl) na primeira sentença e aplica a ele um sufixo. No segundo caso age de forma ainda mais ousada, pois parte do suposto som de um chiado, para criar uma nova raiz (chirim), que por sua vez pode servir de base a outros processos de criação, seja através de afixos, verbalização (transformação em verbo) ou desinência de gênero ou grau.

– Outra fonte muito comum de neologismo são os estrangeirismos, que ocorrem quando há a necessidade de “pegar emprestado” de outras línguas um vocábulo para representar uma nova realidade. Uma fonte muito atual para esse tipo de neologismo é a tecnologia (mas não apenas ela), como se pode ver em expressões como blogueiro, twittar ou internauta (raízes que se aportuguesaram ao ganhar um sufixo) ou site, apartheid ou jeans (que permaneceram com a grafia original, mas foram alteradas na pronúncia e às vezes até na classe gramatical).

– Há estrangeirismos que se formam em função de contextos muito particulares gerados em ambientes de outros idiomas. É o caso por exemplo da palavra Boicote, que é proveniente do nome próprio James Cunningham Boycott, um inglês que liderou um movimento de protesto contra impostos excessivos em seu país.

– Em alguns casos a adoção de palavra estrangeira chega ao ponto de importar também as classes gramaticais do vocábulo em seu ambiente linguístico original. Veja um bom exemplo:

O campus da universidade foi ocupado. O plural seria: Os campi (plural de um determinado caso em língua latina) das universidades foram ocupados.

Há no Brasil uma visão polêmica sobre os estrangeirismos, pois para alguns eles deviam ser evitados, sendo entendidos como vício de linguagem. Já outros os atribuem à dinâmica natural presente no uso das línguas. Sem tomar partido de um ou outro lado, vale a pena citar o gênio de um outro artista brasileiro, o maranhense Zeca Baleiro, que brinca com a presença das palavras estrangeiras no cotidiano atual da língua portuguesa.

“Eu tenho savoir-faire / Meu temperamento é light / Minha casa é high-tech / Toda hora rola um insight…” (Samba do approach).

Amigos, por enquanto é isso. Na próxima edição vamos trazer outras formas, igualmente criativas e interessantes, de inovar (e renovar) a nossa língua portuguesa.


Por Sandro Gomes
Graduado em Língua Portuguesa e Literaturas Brasileira e Portuguesa, Revisor da Revista Appai Educar, colunista da Appai, Escritor e Mestre em Literatura Brasileira.

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