Um espetáculo educacional


Do teatro para a sala de aula, Benefício da Appai promove diálogo cultural entre alunos

 

O sucesso do Benefício Bom Espetáculo da Appai não é somente movido a lazer, mas sim por sua capacidade de propiciar cultura aos seus associados. E ainda mais, propagar diálogo cultural e educacional. Sabe por quê? Uma grande iniciativa unindo arte e educação foi proposta a uma professora e seus alunos, desafiando-os a utilizar uma peça teatral como atividade em sala de aula. E a primeira experiência foi uma explosão de conhecimento entre uma galerinha do Ensino Médio.

Traga-me a cabeça de Lima Barreto foi o espetáculo proposto pelo Benefício, que deveria ser assistido e posteriormente trabalhado em sala de aula. Com mais de 30 ingressos disponibilizados gratuitamente para os alunos do Colégio Estadual Olavo Bilac, em São Cristóvão, a professora de Português Filomena Fernandes agarrou com as duas mãos o desafio e ficou surpreendida com o resultado que foi além do espetáculo apresentado no teatro Gláucio Gill em Copacabana.

A equipe de comunicação da Appai acompanhou os alunos no evento, e o que se pôde ver foi uma turma muito entusiasmada, pois foi criada anteriormente em sala de aula uma expectativa positiva em relação à peça e ao Lima Barreto. Na semana que antecedeu o evento, por exemplo, foi estudado o pré-modernismo, corrente literária à qual pertence o autor. Através do livro didático “Português Contemporâneo – diálogo, reflexão e uso”, que foi adotado pelos professores de Português e Literatura da escola, os alunos puderam ler um fragmento do livro “O triste fim de Policarpo Quaresma”, que coloca em evidência os fatos histórico-sociais presentes no dia a dia das experiências vivenciadas pelo autor. Na peça, os estudantes tiveram a oportunidade de perceber e relembrar tudo o que havia sido discutido e trabalhado em sala de aula sobre as dificuldades enfrentadas por Lima Barreto, como o preconceito e a indiferença, permitindo que fosse reconhecido como um autor detentor de um rico acervo literário e um ser humano igual a todos os outros. Todos foram unânimes em afirmar também que o texto da peça foi escrito com muita maestria.

Inspirado livremente na obra de Lima Barreto, especialmente em “Diário Íntimo” e “Cemitério dos Vivos”, o monólogo teatral reúne trechos de memórias impressas em suas obras, entrecruzadas com livre imaginação e texto fictício. A narrativa tem início logo após a morte do autor, quando eugenistas (termo criado em 1883 pelo antropólogo Francis Galton, significando “bem nascido”.) exigem a exumação do seu cadáver para uma autópsia, a fim de esclarecer “como um cérebro inferior poderia ter produzido tantas obras literárias – romances, crônicas, contos, ensaios e outros alfarrábios – se o privilégio da arte nobre e da boa escrita é das raças superiores?”. A partir desse embate com os eugenistas, a peça mostra as várias facetas da personalidade e da genialidade de Lima Barreto, sua vida, família, a loucura, o alcoolismo, sua convivência com a pobreza, sua obra não reconhecida, racismo, suas lembranças e tristezas.

Já no primeiro feedback após a peça, os alunos estavam eufóricos, de acordo com a professora de Português. “Depois de uma acalorada discussão, chegamos à conclusão de que a peça faz jus à memória de Lima Barreto e nos coloca de forma crítica diante de um passado que ainda sentimos no presente. A herança escravocrata e colonial, que afetou tanto a vida quanto a obra de Lima Barreto, não poderia ser trazida à tona de forma mais contundente. O sofrimento que lhe foi impingido pela sociedade, o alcoolismo e a eugenia foram assuntos muito comentados pelos alunos, que ficaram chocados com as teses de caráter racial, uma questão que veio à tona durante a discussão, que continua dando suporte à discriminação. A trama é tão real que nos faz pensar que os eugenistas existem até hoje!”, ratifica Filomena.

De forma exemplar, Filomena trabalhou a peça sobre a vida de Lima Barreto de modo multidisciplinar: utilizando peça, texto e filme. Na primeira tarefa, os estudantes foram solicitados a fazer em casa um relato dos momentos que vivenciaram durante todo o evento, incluindo também suas opiniões sobre o espetáculo e o que ele acrescentou de informação sobre o escritor, que eles ainda desconheciam, e também sobre o contexto histórico-cultural do Brasil, à época em que viveu. “Em aula, distribuí para os alunos o texto em prosa ‘Sua Excelência’ e pedi que fizessem duas tarefas relacionadas a ele: primeiro solicitei que eles recontassem e acrescentassem outras personagens e outros fatos aos da história, e depois que narrassem tudo de forma resumida, em um texto que tivesse de 30 a 40 linhas. Os alunos viram o filme ‘Triste fim de Policarpo Quaresma’, fizeram anotações e foi pedido que, após o recesso, produzissem um texto tecendo comparações entre a obra original e a adaptação cinematográfica assistida na escola”, relata Filomena.

Indagada sobre o incentivo da Appai de levar uma turma para assistir uma peça abordando um grande nome da literatura brasileira, a professora Filomena foi enfática. “A proposta da Associação foi maravilhosa! A parceria foi produtiva, pois o conteúdo trabalhado em sala de aula pôde ser revisto e complementado através da montagem de teatro. Além disso, eu acredito ser de suma importância para o aprendizado do aluno, para uma melhor fixação do conteúdo, que ele possa sair do limite de sala de aula, frequentar outros espaços que lhe permitam ter acesso a novas informações, através de outros contextos, outros olhares, outras leituras, com o uso de outras mídias, outras ferramentas. Percebo também que o aluno fica mais motivado, mais feliz quando recebe a proposta de adquirir conhecimento de maneira diversificada, o que também facilita o aprendizado. Nessas ocasiões, há também a oportunidade de estimular o crescimento pessoal e favorecer uma melhor interação com os colegas”, enaltece Filomena.

Para as coordenadoras do Benefício Bom Espetáculo Simone Braga e Priscilla Pereira, a cultura em geral, e principalmente as artes cênicas, têm a capacidade de fazer as crianças e os jovens entrarem em contato com outras questões e ver as situações da vida com outros olhos, ou até mesmo penetrar na sua própria realidade mas com outras formas de vivenciá-la. “Este projeto é para estimular os professores a levarem os estudantes ao teatro e a desenvolver o diálogo e atividades posteriores sobre o tema tratado na escola. Mais do que lazer, a arte e a cultura podem ser grandes ferramentas de transformação da sociedade”, esclarece Priscilla.

Se você é associado e tem um projeto educacional envolvendo Arte e Educação, acesse o Fale Conosco e conte-nos sua proposta.

www.appai.org.br


 Por Richard Günter
Colégio Estadual Olavo Bilac
Praça Argentina, 20 – São Cristóvão – Rio de Janeiro/RJ
CEP: 20920-050
Tel.: (21) 2332-4761
Turmas: 2.008 / 2.009 / 3.005 – Ensino Médio
Fotos: Richard Günter

 


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