Segundo a psicóloga infantil Maria Rocha, na faixa etária entre quatro e cinco anos, as crianças têm conhecimento de que todos querem ver o Brasil ganhar o jogo, mas, nem sempre, sabem o que é ter uma identidade brasileira

Por Antônia Lúcia

Em tempos de copa do mundo até os menos apaixonados por futebol se rendem às magias das quatro linhas. No Brasil, uma onda verde e amarela toma conta das ruas, das janelas, das sacadas, das salas de aula, dos corredores, dos pátios das escolas e dos mais longínquos cantos do país. Única seleção com chance de conquistar o hexacampeonato, o time canarinho, que estréia no dia 13 de junho, em Berlim, contra a Croácia, tem sido fonte inesgotável de contextualização por alunos, professores e pelos cidadãos comuns.

Nas escolas, independentemente das faixas etárias, o assunto não tem sido outro. É bola pra cá, é bola pra lá... Todos têm batido um bolão. Para saciar essa sede de gol, professores desde a Educação Infantil até o Ensino Médio têm desenvolvido diversos trabalhos com suas turmas, seja de forma interdisciplinar ou individualmente. “O importante é aproveitar o momento e fazer com que os alunos associem os conteúdos das matérias através da temática”, afirma Rodney Gasparini, professor de Matemática do Colégio Paulista (COPI), que está desenvolvendo o projeto A Matemática na Copa do Mundo 2006.

Segundo ele, a idéia do projeto surgiu exatamente da curiosidade dos alunos em saber qual a probabilidade de o Brasil ser hexacampeão mundial e quais as possíveis combinações de resultados que levariam o país a enfrentar a Argentina na final da competição. Essas e outras indagações serviram de base para Rodney trabalhar conceitos matemáticos como análise combinatória e probabilidade, considerados, por muitos estudantes, um bicho-papão. “A intenção é fazer com que os alunos aprendam os conteúdos matemáticos e façam cálculos de maneira lúdica e descontraída”, garante o professor.

O projeto começa com a apresentação de conceitos tradicionais como análise combinatória (possibilidades para se realizar determinada tarefa) e probabilidade (chances de ocorrência de um determinado evento). A cada aula, o professor de matemática propõe à turma um exercício-desafio. Uma das primeiras provo­cações feita à classe foi a seguinte: quantas escalações o técnico Carlos Alberto Parreira poderia fazer contando com três goleiros e 19 jogadores para as demais posições? Bem, essa resposta ficou por conta do professor Rodney Gasparini que a tem na ponta da língua, ou melhor, na ponta do lápis. São 277.134 possibilidades. O cálculo que gerou o discutido resultado envolve a combinação (C):

De olho no campo, nas tabelas e nos possíveis resultados conquistados pelos mestres da bola, os alunos farão uma bateria de exercícios, cujos conteú­dos a serem explorados são as 32 seleções e a diversidade cultural de cada país. Outras atividades a serem estudadas são: a identificação das figuras geométricas pintadas no gramado, as superfícies da pequena e da grande área e a formulação de vários cálculos em cima das diversas possibilidades levantadas pelos vários torcedores espalhados pelo Colégio Paulista (COPI).
Na opinião de Gasparini, atividades como essas garantem aos alunos aulas mais dinâmicas e praze­rosas. “Afinal, o aluno está trabalhando um tema de seu interesse que está sendo discutido no seu dia-a-dia. Dessa forma, a classe se interessa mais pelo assunto e tem a curiosidade estimulada para resol­ver desafios, muitas vezes, criados por eles. Quando questionado sobre os resultados, Rodney enfatizou que estão sendo sensacionais e serão ainda melhores quando a copa começar, pois é aí que eles irão trabalhar muito com o projeto, a cada dia, a cada jogo”.

Entre as várias conquistas do profes­sor Rodney com seus alunos, uma, segundo ele, é constatar que, através desse projeto, a turma tem percebido que qualquer um pode se sair bem nas ciências exatas, basta trocar o medo pelo interesse. “Não é necessário muito para ser bom em matemática. Com boa vontade e um pouquinho de esforço, ela (a matemática) será, com certeza, sua companheira para o resto da vista”, garante Gasparini, apoiado pela aluna Natália Herbster, do 2.º ano do Ensino Médio, de 16 anos. “Com certeza, fica mais fácil aprender “brincando”. A forma tradicional é cansativa, um saco. Os exemplos dados em aula sobre as seleções ajudam a gravar a matéria e as fórmulas. Na hora da prova, a gente lembra do fato e responde rapidinho”, ensina.

Se, por um lado, o maior evento esportivo do planeta ajuda a contextualizar os conteúdos ministrados em sala; por outro, desperta nas crianças, principalmente, na faixa etária entre quatro e cinco anos, o gosto pela leitura e o reconhecimento de ser brasileiro. Na Escola Ápice Educação Infantil, localizada no Morumbi, Zona Sul de São Paulo, os alunos também já carimbaram seus passaportes para a copa através das atividades desenvolvidas no projeto O que é ser brasileiro.

Segundo a coordenadora pedagógica e psicóloga infantil Maria Rocha, nessa faixa etária entre quatro e cinco anos, as crianças têm conhecimento de que todos querem ver o Brasil ganhar o jogo, sabem que para ganhar é preciso fazer mais gols, mas nem sempre sabem o que é ter uma identidade brasileira. “Se lhes perguntamos: “
Você é brasileiro?”, alguns podem responder: “eu nasci em São Paulo”. Na verdade, as crianças já construíram uma hipótese de que ser brasileiro está relacionado ao local onde nasceram”, adverti a psicóloga infantil.

Por se tratar de um tema que está presente dentro e fora do cotidiano escolar, a coordenadora tem aproveitado a curiosidade das crianças para identificar o que realmente elas já sabem sobre a Copa do Mundo. Segundo ela, o assunto aparece espontaneamente nas rodas de conversa e em outras situações nas quais a criança expressa seus pensamentos e opiniões. Os meninos mostram-se mais entusiasmados, porque o futebol já faz parte de seu universo e o modelo masculino é muito forte nesta fase.

“Aos 4 e 5 anos, as crianças sabem apenas que a Copa do Mundo é um campeonato de futebol, do qual o Brasil participa. O time de futebol para o qual habitualmente torcem lhes é muito mais familiar do que a seleção brasileira. Isso eles ainda não entendem muito bem. Conhecem também o nome de alguns dos jogadores mais famosos, nem sempre associando-os aos diferentes times que habitualmente jogam”, avalia Maria Rocha.

Em sala ou fora dela, as atividades não param. Na Escola Ápice, a turma que ainda não completou seis anos participa de atividades relacionadas ao falar e escutar, sendo o professor leitor e escriba em muitas das rodas de conversa. Quanto aos trabalhos de pesquisas sobre os países de que eles descendem, sua localização no mapa, sua bandeira, seus hábitos e costumes, a professora explica que deverão ser feitos de maneira lúdica, mas sempre de forma a propiciar experiências que possibilitem o melhor entendimento deles quanto ao exercício da cidadania.

“Aproveitamos o tema Copa do Mundo, que, neste momento, torna-se muito significativo, para buscar informações valiosas que ajudem as crianças a refletir sobre as diferentes culturas e, até, descobrir que outras crianças no mundo, assim como elas, brincam de bola, ouvem histórias e têm outras atividades comuns, independentemente de seu país de origem”, acentua Maria Rocha.

Ao ser questionada sobre por qual parte do projeto os alunos têm demonstrado maior interesse, a coordenadora pedagógica e psicóloga infantil Maria Rocha explica que, por trabalhar com uma proposta construtivista, todos os assuntos da mídia que, de alguma forma, interessam aos alunos são vistos em sala de aula. “Todas as informações relacionadas ao Brasil tornam-se muito significativas neste momento, pois sua participação no projeto amplia muito o conhecimento dos alunos acerca do que é ser brasileiro – as cores verde e amarela, por exemplo, os remetem instantaneamente ao seu País do Futebol”, finaliza a psicóloga.

E, por falar em país do futebol, responda rápido: dos 23 jogadores convocados pelo Brasil, quantos atuam na Europa? Em 17 Copas do Mundo já disputadas, o Brasil teve o artilheiro da competição em três oportunidades. Quem são eles? Qual foi a pior colocação do Brasil na história das copas? Somente dois profissionais já conquistaram a Copa do Mundo como jogador e técnico. Quem são eles? Em que horário (hora de Brasília), o Brasil jogará as três partidas da primeira fase? Bem, se você respondeu corretamente às cinco perguntas, parabéns! Caso contrário, uma suges­tão é pedir ajuda aos alunos da 4.ª série do Ensino Fundamental da Escola São Camilo, localizada em Brasília/DF, que, nesse semestre, estão trabalhando o projeto Copa X Conhecimento.

Interdisciplinar, o projeto idealizado pelas profes­soras Elaine Cristina da Silva e Suzana Ferreira Romão tem como base contextualizar os conteúdos abordados nos bancos escolares nas diversas áreas do conhecimento. Segundo Elaine, as atividades do projeto tiveram início a partir da confecção do globo terrestre para que os alunos pudessem trabalhar a localização do continente Europeu, no qual a Alemanha está situada.

“A partir daí, trabalhamos extensão da área, cálculos, circunferências e porcentagem, estimulando, assim, o raciocínio lógico em Matemática. Além da produção textual, em Língua Portuguesa, os professores exploraram a leitura a partir dos trabalhos de pesquisas feitos com as reportagens divulgadas nos jornais, revistas e Internet. Nós orientamos os nossos alunos a trazerem as matérias e afixarem num mural da escola, intitulado
Fique por dentro da Copa!”, diz a professora Elaine.

Para que todo esse trabalho pudesse ser mostrado, a comunidade escolar e as turmas de 4.ª série – manhã e tarde – realizaram várias atividades, dentre elas: seminários, gincanas, exposição dos trabalhos, jogos e até um esquete com foco no tema proposto. Para a culminância que ocorrerá logo após o final da Copa do Mundo, Elaine juntamente com seus alunos, já prepara várias surpresas para o público visitante, entre elas a apresentação de trajes e a degustação de várias comidas típicas da Alemanha e do Brasil.

Apostando na vitória da seleção pentacampeã, as professoras farão uma homenagem à seleção campeã da copa 2006. “Os alunos estão produzindo uma peça que será apresentada no dia da culminância. Aproveitamos para convidar os pais para prestigiarem o resultado final do nosso trabalho, já que eles têm se empenhando e colaborado bastante para o êxito do evento”, finaliza Elaine.

Colégio Paulista (COPI)
End.: Av. Lins de Vasconcelos 1264 – Aclimação –
São Paulo/SP. CEP.: 01538-001
Professor: Rodney Gasparini
Tel.: (11) 3385-8010
Ápice Educação Infantil
End.: Rua Jannarelli, 348 – Morumbi – São Paulo/SP.
CEP.: 05615-000
Coordenadora: Maria Rocha
Tel.: (11) 3721-7690
Escola São Camilo
End.: SGAN 914 conjunto G/ Asa Norte – Brasília/DF
CEP.: 70790-140
Professoras: Elaine Cristina e Suzana Ferreira
Tel.: (61) 3273-0126
Ilustrações: Luiz Cláudio