Álvaro Lins (*)

Existe uma relação direta entre a qualidade da educação no Brasil e o crescimento da criminalidade. Muitos jovens, quando encontram dificuldades para conseguir emprego e não vislumbram perspectivas de progressão social, enxergam no tráfico, principalmente, um atalho para melhores condições de sobrevivência. Nossa educação ainda tem grandes problemas, como, por exemplo, os baixos salários dos professores. Entretanto, o grande desafio é a evasão escolar.

No Brasil, a escolaridade média da população é de 4,9 anos por habitante. Na Costa Rica é de 6,1; no México, 7,2; na Argentina, 8,8; na Coréia do Sul, 10,8; e nos Estados Unidos, 12,1. Com um tempo de permanência na escola tão baixo, o brasileiro médio tem pouquíssimas chances de conseguir um emprego decente. E, em áreas muito carentes, como as favelas, essa realidade ainda é mais cruel, pois somam-se ao baixo desempenho escolar as habitações precárias, a falta de higiene e saneamento, a inexistência de uma política séria de planejamento familiar, a glamourização do tráfico pela imprensa e vários outros problemas.

Todos os países que estão vencendo essa batalha adotaram o combate à evasão escolar como uma política pública prioritária. No Chile, por exemplo, as escolas passam por uma avaliação anual baseada em dois critérios: rendimento e índice de evasão escolar. Nas unidades onde os alunos tiram as melhores notas e nas quais há baixa evasão, os professores recebem um prêmio em dinheiro durante todo o ano seguinte. Isso os motiva a lutar para que todas as crianças permaneçam na escola. Outra medida importante é uma bolsa-auxílio para o arrimo de família concluir o ensino médio. Com o segundo grau completo, esse pai de família teria mais condições de conseguir bons empregos, quebrando o círculo vicioso que obriga crianças a abandonar a escola para trabalhar.

Outro ponto importante é trazer a comunidade para dentro da escola. O programa Escola Aberta, em Pernambuco, conseguiu reduzir em 30% os delitos mais comuns entre os jovens da periferia, ocupando seus finais de semana com oficinas de teatro, capoeira e hip-hop. O programa surgiu a partir de uma pesquisa que demonstrou que a média de homicídios entre jovens dobrava aos sábados e domingos. Além das atividades culturais, as escolas ainda poderiam oferecer outros serviços do Estado como emissão de carteira de trabalho, identificação civil etc. Enfim, um enxoval de cidadania para que esses jovens sintam-se mais integrados à sociedade.

Gosto de citar, como exemplo para o problema da evasão escolar, uma história que presenciei. Quando criança, estudei numa escola municipal no bairro da Gávea, no Rio de Janeiro. Na minha turma, havia crianças do Vidigal e da Rocinha, favelas muito próximas à nossa escola. Um deles chamava-se Sérgio e fazia parte do meu grupo de amigos. Aos doze anos, Sérgio deixou a escola e não tivemos mais contato. Fui reencontrá-lo anos mais tarde. Eu, que continuei na escola, cursei a faculdade de Direito e passei no concurso público para delegado, acabei como chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro. Sérgio, que largou – ou foi forçado a largar – a escola, acabou conhecido como Sérgio Bolado – chefe do tráfico na Rocinha, morto com dezenas de tiros num confronto com traficantes rivais. Sempre imagino qual teria sido seu destino caso ele não tivesse abandonado a nossa escola na Gávea.



(*) Álvaro Lins é delegado e ex-chefe de Polícia Civil do Rio de Janeiro.
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