Quem não Cola não Sai da Escola faz humor com assunto sério, que se agravou com a Internet

A escola é um local privilegiado para a aquisição de conhecimentos e o desenvolvimento de habilidades. Nela, as avaliações consolidam os degraus percorridos pelo aluno em sua trajetória educacional. Exercícios, trabalhos e provas são apenas mecanismos para que o estudante perceba como anda seu aprendizado. Graças a essas atividades, ele pode certificar-se de que compreendeu determinados conteúdos. E, diante de eventuais lacunas, tem como dedicar-se a saná-las. Certo?

Errado, ao menos de acordo com o que pensam os personagens de Quem não Cola não Sai da Escola. É uma comédia, voltada para o público jovem, mas nem por isso deve ser levada menos a sério do que uma análise sisuda sobre o tema. Ao contrário: muitas vezes, são os filmes de aspecto mais inocente os responsáveis pela disseminação de conceitos (e preconceitos) já enraizados na sociedade ou, no mínimo, populares entre alguns de seus setores.

Aqui, propaga-se uma visão que desagrada aos educadores, mas que é corrente entre muitos dos que passaram pelo ensino formal: a escola é apenas um obstáculo na corrida da vida e deve ser superado da maneira menos dolorosa possível. Como ali não se aprenderia nada de relevante para aplicação cotidiana, os fins justificariam os meios. Assim, fraudar as obrigações escolares seria uma ferramenta aceitável para alcançar o objetivo maior de formar-se e, então, viver.

Os protagonistas de Quem não Cola não Sai da Escola orgulham-se de fraudar toda espécie de avaliação, desde a pré-escola até o último ano do ensino médio, que estão prestes a concluir. Seus métodos são os mais variados: “cola”, em letras minúsculas, escondida na embalagem do chiclete, roubo de provas, cópias das anotações dos alunos mais esforçados. Só faltou lembrar o potencial para fraude representado hoje pela Internet.

“Por que estudar?” – A frase promocional que acompanhou o lançamento do filme nos EUA resume essa filosofia, que elege como adversários a diretora da escola (Mary Tyler Moore) e os professores – todos caracterizados como paspalhos, enquanto os “coladores” adquirem status de heróis. Nem a conclusão da história melhora as coisas: embora pareça moralista, ela consagra a perspectiva de que o negócio é levar vantagem, sempre.

Entre profissionais de educação, uma comédia ingênua (será mesmo?) como essa pode esquentar o debate a respeito de temas considerados tabus, como o fato de que parte dos alunos não vê sentido na escola, menos ainda nas avaliações. Estariam mesmo errados? Não haveria equívocos graves no sistema escolar, despreparado para acompanhar a velocidade das mudanças na sociedade? Todos os professores sabem avaliar? A “cola” (e sua versão moderna, o plágio via Internet) é também uma resposta espontânea a um modelo em crise. Demonizá-la, sem refletir sobre suas origens, não leva a lugar nenhum.

Obs.: Matéria cedida pela Revista Educação
Colaboração: Sérgio Rizzo

(Edição n.º 84 – Abril/2004)