Através de vários projetos que integram Educação e Esporte, ex-jogadores de vários Estados fazem do futebol um reforço a mais no exercício da cidadania

Por Antônia Lúcia

Numa jogada espetacular, o futebol saiu das quatro linhas e invadiu, sem pedir licença, as salas de aula, marcando um gol de placa em favor da Educação. Devido ao seu grande potencial de discussão, o tema futebol tem sido tratado nas escolas e nas atividades extraclasse como uma ferramenta de extrema valia no processo de ensino-aprendizagem, e, com isso, a modalidade vem ganhando espaço dentro e fora das escolas, como um reforço a mais no exercício da cidadania e em diversas áreas do conhecimento.

Muitos desses gols têm sido marcados pelas escolinhas de futebol, as quais possibilitam que crianças e jovens iniciem a prática esportiva, desenvolvendo suas competências e potencializando-os para uma edu-cação integrada. Um exemplo é a Vila Olímpica da Rocinha, coordenada pelo professor Ênio de Figueiredo - ex-técnico da Seleção Brasileira de Vôlei.

Atendendo a mais de mil jovens entre 6 e 17 anos, que duas vezes na semana vão até a Vila praticar alguma modalidade esportiva, o Centro também oferece atividades educacionais como aulas de reforço escolar, informática, inglês e oficinas profissionalizantes.

Segundo os pais, é notória a diferença no comportamento das crianças que participam de tais atividades. “Depois que meu filho começou a freqüentar a escolinha, eu pude perceber uma melhora muito grande no convívio familiar e um maior interesse pelas atividades escolares”, afirma Célia Regina, moradora da Rocinha e mãe de um dos alunos da Vila Olímpica.

Com a proposta de colaborar para que crianças e jovens se tornem aptos a exercer plenamente seus direitos e deveres como cidadãos conscientes, o Projeto Legião de Craques, desenvolvido em Brasília e idealizado pelos coordenadores Alexandre Monteiro (Tico) e Italo Nardelli Filho (Dango), vem, a cada jogo, driblando as barreiras das “desigualdades” e marcando um golaço no campo social.

O trabalho desenvolvido pela Legião de Craques, sob o lema Tocando Bola pela Cidadania, tem proporcionado a centenas de meninos de famílias de baixa renda e origem humilde, moradores de cidades da periferia de Brasília, uma oportunidade única de driblar e vencer um forte e inoportuno adversário dentro e fora dos gramados: a desigualdade social.

 

Para Marcus Marconi e Beth Nardelli, integrantes da equipe do projeto, esse adversário, que joga em todos os times, de norte a sul do país, e, quase sempre, tem saído vitorioso no final de cada partida, vem, aos poucos, sendo derrotado com a determinação e o apoio de pessoas que acreditam que esse jogo, quando feito de forma séria e comprometida com o social, como é o caso da Legião de Craques, pode ser virado.

O esquema tático da equipe não fica só no 4-4-2 ou no 3-5-2, uma vez que agrega atividades socioeducativas e inclui desde a formação do time à concessão de alguns benefícios, tais como: cesta de alimentos, aulas de natação, assistência médico-odontológica e transporte gratuito para os jovens talentos fazerem o que mais gostam e sabem: jogar bola. Uma das principais exigências da comissão é que todas as crianças participantes devem estar freqüentando as aulas e ter um bom aproveitamento escolar.

Fora das quatro linhas, entra em campo, ou melhor, nas casas, um reforço de peso para o orçamento das famílias dos atletas: a complementação alimentar da cesta básica. Em alguns casos, esse benefício é fundamental, uma vez que muitos pais estão desempregados ou, como a maioria, ganham a vida com biscates e subempregos.

Todo esse esforço coletivo em proporcionar – se não a todos, mas, pelos menos, a uma parcela de brasilienses – o direito de aprender a exercer a cidadania, fazendo o que mais gostam: correr atrás da redondinha, driblar e chutar a gol, tem sido garantido através de apoios e patrocínios de empresários, personalidades, atletas locais e outros.

Mas, para que essa bola continue sendo tocada, a equipe da Legião de Craques precisa contar com mais parceiros que saiam da arquibancada, entrem em campo e vistam a camisa da equipe. Para o coordenador de Marketing Social da equipe, Marcus Marconi, a intenção é solidificar, cada vez mais, as parcerias conquistadas e obter novos patrocínios nessa empreitada social.

Desde junho, a academia Cia. Atlética tem garantido aos jovens talentos a oportunidade de desenvolverem e aperfeiçoarem o seu condicionamento físico três vezes na semana, com aulas de natação, musculação e defesa pessoal. Segundo o coordenador de Marketing da equipe, essa aliança com outros empreendedores é fundamental para o crescimento do projeto, “porque, como no cosmos, as nossas estrelas não existem isoladamente: trazem e dependem de outros astros, formando uma equipe tal qual no universo ou em um sistema planetário”, finaliza Marconi.

Outra escolinha que vem desenvolvendo um trabalho de socialização e integração utilizando a prática esportiva como elemento catalisador é a do ex-jogador do Flamengo e do América Paulo Henrique. “Cerca de 10% dos alunos da sede do Rio são oriundos de comunidades carentes, por isso, nós temos a preocupação de sociabilizar e integrar essas crianças de comunidades menos favorecidas, dando-lhes a oportunidade de participarem do nosso projeto de forma harmoniosa e em conjunto com aqueles de classes mais privilegiadas”, afirma o professor. Paulo Henrique, em entrevista ao Jornal Educar, salientou que uma das exigências da escolinha é que a criança esteja matriculada na escola.

Interdisciplinaridade no Esporte

Independente das áreas de estudo ou da atividade curricular, a interdisciplinaridade vem, cada vez mais, ocupando espaço na produção do saber, fazendo inter-relação entre os conteúdos das disciplinas e a influência entre eles.

É o caso da competição interclasse realizada no Colégio Duque de Caxias, cujo tema foi A Copa do Mundo. As equipes foram separadas por países e todos tiveram que pesquisar a história de uma determinada nação, sua economia, seus costumes, sua população, comidas típicas e uma série de dados que requereram um pouco de conhecimento sobre várias disciplinas.

Segundo o coordenador de Educação e Desporto Alexandre Miranda, do Colégio Duque de Caxias, o esporte tem uma função interdisciplinar, uma vez que os alunos não se detêm somente ao fato de jogar bola ou praticar outra modalidade esportiva, mas principalmente de buscar outros conhecimentos dentro dessa prática.

Cooperação, Socialização e Interatividade

A psicopedagoga Simone Antaki, do curso Momento Atual, ressalta que a essência da atividade esportiva, em qualquer modalidade, está na capacidade de integração com o ensino-aprendizagem, levando para dentro da sala de aula e para o convívio familiar o senso de respeito, união e disciplina, e ressaltando a importância de se cumprir regras.

Na visão de Elder, ex-jogador do Flamengo e atual coordenador do Juvenil do Clube de Futebol Zico (CFZ), o esporte, quando bem orientado, incita o aluno a desenvolver o raciocínio lógico de uma maneira mais ordenada e disciplinada, ratificando que essa integração esporte-escola é fundamental na prática do exercício da cidadania.

Todavia, para que esse mecanismo funcione, o coordenador do Juvenil do CFZ explica que a proposta do professor tem de estar pautada na proposta pedagógica da escola, para que o aluno, ao participar das atividades esportivas da escola, não se sinta na obrigação de ser um atleta, mas sim um cidadão consciente que busca reforçar valores como cooperação, socialização e interatividade.

Para os pais de alunos envolvidos em alguma atividade esportiva, a conjugação entre a atividade física e a curricular traz inúmeros benefícios tanto para o aluno, como para os professores e familiares desses jovens, principalmente em termos de disciplina, aproveitamento escolar e convívio social. “Além de prazeroso, o esporte tira os nossos filhos das ruas e acaba, indiretamente, fazendo uma reaproximação familiar”, relata Luiz Antônio, pai do aluno-atleta Bruno Rios, do CFZ.

Zé Carlos, ex-goleiro da seleção brasileira, partilha da mesma opinião e lembra que a própria Federação de Futebol exige que os atletas amadores estejam estudando, “porque num futuro bem próximo, mesmo que a criança tenha, ou não, se tornado um atleta reconhecido, essa cobrança será de vital importância na sua vida profissional, independente da área em que esteja atuando”, frisou Zé Carlos.


Legião de Craques - Tel.: (61) 345-8415
Elder - Tel.: (21) 9801-5947
Escolinha Paulo Henrique - Tel.: (21) 9838-1204
Zé Carlos - Tel.: (21) 7875-2069
Vila Olímpica da Rocinha - Tel.: (21) 2570-4600