Alunos da Educação Infantil escrevem livro e falam sobre seus sonhos, medos e desejos

Por Tony Carvalho

Construir um novo elo social a partir da descoberta do próprio eu. Esta experiência está sendo vivenciada por 160 alunos da Educação Infantil do Ciep Nação Rubro-Negra, no Leblon. Eles participam do Projeto Conviver – um trabalho calcado na identidade e na auto-estima da criança –, que culminou em uma exposição de parte das atividades realizadas em sala de aula, promovida pelos alunos.

A idéia do projeto surgiu em outubro do ano passado a partir da percepção de que a auto-estima das crianças necessitava de uma boa dose de estímulo. Desde então, uma equipe de profissionais e voluntários iniciou a elaboração de atividades que serviriam como referência para o projeto.

Segundo a diretora do Ciep e coordenadora do projeto, professora Maria Célia Pordeus, os resultados podem ser notados a olhos vistos: as crianças se tratam melhor, a agressividade com os colegas foi reduzida e o interesse pelas atividades em sala de aula aumentou. “O projeto ainda não está concluído, apenas executado parcialmente. Mas estamos contentes com o que foi proposto e o que já está sendo obtido”, explica.

Os trabalhos expostos tiveram como referência a formação da identidade de cada um dos alunos, que passaram a conhecer um pouco mais de sua história e da origem de suas famílias. Para tanto, psicólogos e orientadores realizaram, no início do ano, uma pesquisa com os pais das crianças. O objetivo foi traçar um perfil de cada aluno e de seus familiares, coletando dados como o Estado de origem dos pais, informações sobre o processo de gestação da mãe e o comportamento da família.

“O projeto estimula a criança a aumentar o amor próprio e ainda incentiva o desenvolvimento da coordenação motora através de trabalhos artísticos. Conversando com alguns deles, já dá para perceber uma sensível melhora em suas referências como indivíduo. Eles já começaram a entender que não estão sozinhos, mas, sim, inseridos em um grupo social”, conta Valéria, uma das 30 professoras envolvidas no projeto.

As crianças engajadas no Projeto Conviver moram nas favelas da Rocinha, Cruzada São Sebastião e Vidigal, e a realidade que eles vivenciam em suas comunidades é, na maioria das vezes, bem distante da que seria considerada ideal. Jéferson de Souza, 9 anos, é uma das crianças que já começaram a se autodescobrir.

Ele e os demais alunos da 3.ª Série construíram o álbum de suas vidas. Em cada página, expressaram, através de desenhos ou textos, como se viam e qual a imagem que tinham de seus pais, da escola e da comunidade onde moram. Também falaram do que gostam de brincar, dos sonhos que almejam e o que pretendem ser quando crescer. Na última página do livro, uma mensagem que, independente de palavras ou imagens, registra a esperança de um futuro melhor: “É como olhar no espelho e me ver diferente. O álbum da minha vida reflete tudo aquilo que está em mim”, afirma Jéferson.

Em outro estande, quem visitou a exposição pôde conferir um painel com auto-retratos. Cada aluno trouxe uma fotografia que lhe remetia a algum fato marcante de sua vida. Baseado no registro fotográfico, cada estudante construiu um texto no qual tentava explicar o porquê da escolha da foto. Para a professora Patrícia, o mais importante é o aluno identificar os sentimentos que podem aflorar durante o processo. “A questão da identidade está vinculada à memória. É uma forma de eles retomarem suas características de indivíduo. Cada um tem uma história de vida e, para que eles descubram o seu papel na sociedade, é preciso primeiramente que eles se conheçam”, diz.

Na biblioteca da escola foram instalados computadores que permitiram aos alunos uma viagem virtual aos Estados de origem de seus pais. Muito mais do que conhecimentos geográficos, eles puderam entrar em contato com o mundo vivenciado por seus pais e, quem sabe, até entendê-los um pouco mais.

Além dos professores, o Projeto Conviver contou com a participação dos amigos da escola. “Dentro do projeto, eles apresentaram um sub-projeto. O Dr. Abelardo, por exemplo, é pediatra e desenvolveu um projeto sobre saúde e higiene do ambiente, com o envolvimento de todos na escola. No final, os melhores trabalhos foram premiados. Rogério foi outro voluntário. Ele organizou aulas de basquetebol buscando incentivar a relação interpessoal, o companheirismo, a divisão de tarefas e a sociabilização”, completa a professora Maria Célia.

Na exposição, era possível sentir um ar de alegria estampado não só nos rostos das crianças, mas no semblante de surpresa dos muitos pais presentes. Ao constatar os resultados obtidos através das pesquisas feitas no início do ano, eles também se descobriram um pouco. Ao folhear o livro da vida, a sensação era de quem tentava decifrar o significado de cada desenho feito pelo filho. Talvez isto explique o que a professora Maria Célia quer dizer com um projeto inacabado. Na verdade, ele se completará no dia-a-dia, nas relações interpessoais entre os alunos, pais e a comunidade em que vivem.

Ciep Nação Rubro-Negra
Tel.: (0xx21) 2259-1048